quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Memórias 20

Amadora
1985-01-01

Ano novo, vida nova! Assim deve ser, a todos os niveis, dando preferência ao moral e temporal. Para isso, é preciso. já se vê, agir
com tino. A cabeça., afinal, foi-nos dada por Deus, com esse fim.

Se temos desvios, a culpa é nossa e de mais ninguém.
Para ser diferente o nosso viver, no ano do Senhor, hoje iniciado,
basta desejá-lo e fazer esforço, pedindo ajuda a Quem governa.

Daqui a urgência do chamado 'balanço. afim de apurarmos ganhos e perdas, tanto numa esfera como na outra.'O aspecto material, por ser premente, a ninguém escapa. e se alguém o não faz, é porque anda às cegas! Vira e revira, não sabendo o Norte.

Só os mentecaptos, insuficientes, falhados mentais ou pessoas ingénuas é que não se preocupam, acerca do facto É agora bom ensejo de anotar, a rigor, como tudo correu, em 1984. Apuradas as falhas, traçar novas linhas, conducentes ao êxito. Trate-se embora de coisas materiais, devemos socorrer-nos do auxílio divino, indo até Deus,para implorarmos a sua intervenção.

Como irá ser o ano presente de 85?
Depende, obviamente, do Céu e de nós.Na parte que nos toca, urge reagir e ser generosos,corrigindo os defeitos e pondo em prática os Mandamentos. Vivendo na sua graça, tudo corre bem. Alheados d\Ele, é desgraça pela certa!

Neste dia, pos, em que tem início o Novo Ano, suplico a Deus me dispense favores, para ser capaz de agir rectamente Não quero jamais proceder como bruto. Atender à vida física? Sim. Mais ainda, claro está, olhar muito a sério, pela vida moral, quero dizer,
o meu progresso, no ramo espiritual.

Fugir sempre do mal dominando a natureza, é caminho seguro, para chegar até Deus. Vigiarei o coração, para que não se enrede e prossiga em liberdade, Confio plenamente, na bênção de Deus, para chegar ao fim com a alma lavada.

Ao triste passado há nuito renunciei, enveredando logo, por uma senda que julgo segura. O Espírito Santo me guie e revigore,
para levar a bom termo o que me proponho!

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Amadora
1985-01-02
" Quem me ladra às costas respeita-me na cara".

Como era ignorado este belo anexim, decidi registá-lo, fazendo a propósito, alguns comentários.De facto, não me lembra havê-lo escutado. Quem o transmitiu foi a mana Agusta que, por seu lado, o tinha ouvido ao padre Calheiros.

O que deixei ao alto é, a rigor, a forma tradicional, como fui informado. Entretanto, aquele que a usou fez leve alteração, dizendo como segue:Quem me ladra ao cu, respeita-me na cara.

Postos em campo os dizeres registados, convém debruçar-me, por alguns momentos, sobre o conteúdo.
O ladrar é própro dos cães, intentando agredir,quando seguem alguém. Denota, pois, intento malévolo. Por ouro lado, revela cobardia, uma vez que a pessoa se não mostra de frente.
Receio d e ataque? Medo do castigo?! Insegurança e falta de firmeza?!
Bom. Sabemos, ao certo, que essa atitude revela má vontade, grande rancor e mau sentir. Designam por ladrar a fala
exasperada, acusatória, agressiva e de censura. Trata-se, pois, dum termo depreciativo, humilhante e cáustico, para alguém visado.
A segunda parte "respeita-me na cara", dá logo a perceber que há falta de coragem, para arrostar com o outro parceiro.
Essa postura denota, ao que julgo, inferioridade, complexo, talvez, ou ainda complexo..

Inúmeras causas podem originá-la: falta de razão que seja a bonatória; timidez natural , gerada por princípios ou devida ao lar; receio fundado que vai fiiar-se no bom nome de outrem ou na sua influência, prestígio e fama; reconhecimento, claramente implícito, de estar em mau campo; cobardia manifesta que leva alguém a proceder, a ocultas.
São inumeráveis as motivações.
Há um provérbio que diz assim: " Cão que ladra não morde!"
Entretanto, se o ladro vem do homem, deixa sempre vestígios que
são maléficos
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Amadora
1985-01-03 Encontros

Alguns aí há que são fatais; outros, indiferentes; ainda os terceiros , que nos enchem de gozo. Os dois primeiros a ninguém interessam, agudizando-se o caso, se tazem a ruína ou causam a morte! Quanto aos derradeiros, a coisa é bem outra! Quem não aprecia um encontro desses?!

Pessoas de família que há muito se não viam; amizades sinceras, que o tempo e a distância não lograram esfriar; afectos e amores que aviventam as almas... tudo o que enflora a nossa existência, fazendo-a aceitável, quando não benquista e assaz desejada, é coisa preciosa de alto valor!

Por estas razões, aspiramos vivamente a que o tempo não avance.
Queremos até prolongá-lo muito, ficando assim a vivê-lo, por todo o sempre!.A verdade, porém, é que tudo se esvai, tudo se esboroa, ficando na alma um vazio imenso!

Entretanto, embora fugazes tais momentos de ventura, dão cor e relevo à existência apagada que levamos, neste mundo! Acabaram? Que importa isso?!Vivemos a fundo a alegria dessa hora e, por ser alta a vivência, balança talvez os dias tristes,
ingratos e amargos que a vida nos oferta. São uma desforra, boa compensação, recompensa e atenção, por quanto amargura!

Sem eu querer, entreguei-me a digressões, levado pelos casos da minha própria vida! Tantos desaires! Tanta decepção! Tamanhos logros!
Que podem originar? Donde não esperava é que vieram, tantas
vezes, as maiores decepções!
Como fica a nossa alma, em tais circunstâncias!
Mas, afinal, que vem a ser a vida, senão larga decepção?! Se, até dentro de nós próprios, há contradições! Quanto mais nos outros, em ordem a nós!
Só Deus é estável firme e resoluto, imutável e igual!
Tudo o mais é volúvel, decepcionante, inseguro!

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Lx, Belém
1985-o1-04
Já que tudo é assim, efémero e passageiro, não convém fxarmo-nos, olhando esta vida como sendo, realmente. o alvo final! Simples recurso e nada mais, para alcançarmos a meta do fim! Embora com espinhos, escolhos e cachopos, trilhando os caminhos, sempre em alerta, com grande cuidado, vamos prosseguindo, em ordem ao termo: alcançar o porto da eterna salvação!

De notar, porém, que nem sempre o diabo se acha atrás da potta! Há boas abertas, ocasiões maravilhosas de pôr a nossa alma em grande frenesi. Esses raros ensejos conferem dinamismo, para enfrentarmos a vida terrena.

Se há, na verdade, indivíduos perversos, que vestem a rigor, a pele do diabo, outtos há também que são contra-vapor, compensando maus bocados e azares angustiantes! Vem aqui a propósito o encontro, ali nos Jerónimos e depois, na Ajuda.
-- Então, não me conhece?!
-- Como não ?! -- atalhei prontamente, cheio de bonomia e
fundo regozijo.
Estava em presença o engenheiro Soveral, que preside ali. na Tapada da Ajuda, ao Lasoratório Rebelo da Silva.

Somente de o ver alegrou-se a minha alma, voltando com ele aos tempos de outrora, no límpido Outeiro de S,Miguel, não longe a Guarda. Então, era ele estudante, e eu profesor. Já lá vão
uns bons anos! Pois não foi o caso, em 1945'!!

Passaram 4o anos Como o tempo foge e a vida se escorre!
Quarenta anos! Estava ele. à data, no 3º Liceal, mostrando.se já como seria depois! Um aluno modelar, em toda a acepção que a palavra comporta. Apesar de excelente, era tão modesto, que se diria apagado.
Se não me engano, ainda hoje assim é, ao menos em parte. Um cavalheiro distinto, idóneo e modesto, assaz admirável cuja estatura não podemos atingir nem aprofundar convenientemente.

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Lx. Belém
1985-01-05 Cont.
De outras vezes, encontrava-o isolado. Desta, porém, o caso foi outro. Havendo falecido alguém de família, se bem me recordo, irmã do sogro, estavm reunidos, ali, nos Jerónimos, para tomar parte no préstito fúnebre. Houve Missa e Funeral, por alma de M. Flávia.
Como bom católico e amigo dos seus, o nosso Engenheiro comungou também, dando assim prova de suas convicções e da bela amizade que o liga à família.

Acabada a função, na Capela mortuária, abeirou-se de mim, para saudar-me. Foi nesse momento que o reconheci.
Dentro da sala, por escassez de luz, não me apercebi de que era ele. Entretanto, no sorriso peculiar, de que eu não perdera a boa memória, cheguei à conclusão : Engenheiro Soveral!
Bom. Ali pertinho, havia duas jovens que olhavam atentas
Ele, então, sem perda de tempo, faz desde logo. a apresentação:" -- Estas são minhas filhas!"
Houve cumprimentos, troca de impressões e palavras cordiais.
Em jeito de graça, arriscou uma delas ;
-- Era malandro, quando estudante?!

Ripostei logo, tecendo justamente grandes elogios à figura prestigiosa do então aluno que sempre alcançava notas invejáveis.
Agorá, organizava-se já o vistoso cortejo, que tinha por destino o cemitério da Ajuda.

Uma vez aqui. terminada a cerimónia, fazem-se então apresentações de pessoas novas: gente de angola, onde eu, como ele, havíamos trabalhado. Quando isto vem a pêlo, é sempre com
alvoroço!
Seguidamente, é meu interlocutor um angolano, deveras saudoso, originário de Luanda. Por isso, arrisquei a pergunta:
conhecia, por acaso, Mabílio Mendes de Albuquerque?

Oh! pergunta que eu fiz! Veio desde logo um chorrilho
infindáve, feito de alusões e bom entendimento, entre eles todos.

Então, disse eu: sou primo dele!
Foi um delírio! O mundo é pequeno, afinal de contas!

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Lx. Belém
1985-o1-06
Remontando ao Passado! Fundão!

De velho se volta a menino: assim diz, na verdade, o saber popular.Estarei já incurso, na lista dos velhos? Julgo bem que não! Tenho ainda aspirações e luto com ardor, afim de realizá-las.

Entretanto, alguns sintomas já me deixam hesitante.
Vêm, ao de cima, os dizeres expressivos da remota infância e, bem assim, os da grata adolescência. Lembram, ao vivo, atitudes e maneiras, costumes venerandos e tradições sagradas, existentes no lar e assumidas também pelos conterrâneos, a partir de meus pais e gratos companheiros de tantos brinquedos!

Nesta ordem de ideias, tomam alto relevo e cor definida os
velhos condiscípulos, estudantes no Fundão, onde iniciei os primeiros estudos. Foram 4 anos que ali decorreram, fazendo como dizem, os preparatórios.

Pois dessa época, já tão distante, surgem, nesta hora, as figuras esquecidas de vários rapazes, que singraram depois em outro
sentido. De quase todos me lembro, se bem que os seus nomes já estejam olvidados.

Recordo episódios, ocorridos nas aulas ou ainda em recreios, sem faltar, já se vê, o que está relacionado com a ida para férias. O que estou escrevendo respeita aos do curso de 1933. Era a 11 de Outubro que dávamos entrada, no velho Seminário, sito na base da Serra da Gardunha., não longe do Fundão.

Alguns deles eram muito crianças, pois não iriam, talvez, além dos 10 anos ou então dos 11.O Albano e eu tínhamos já 15.
O José Nunes era o mais velho.

Apraz-me agora exarar alguns nomes que emergem da
penumbra, em que o tempo os lannçou: Albano Gomes, Pedro da
Fonseca, Bernardo Terreiro do Nascimento, Alexandre Gonçalves, Agostinho Geraldes de Castro, Arnaldo Cardoso Ferreira, António Moura Cabral,

Todos estes se ordenaram, sendo já falecidos o Afnaldo e o Cabral. Restam, pois, 48, uma vez que o total era de 55.
Tentarei recordar, pelo menos alguns, assunto grato que fará parte do Diário seguinte.
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Lx. Belém
1985-01-07
A maior parte destes 48 ficaram pelo caminho, desistindo, no prrincípio, quando no Fundão. A Filosofia iniciava-se na Guarda, já no 5ºano. Que tenham vindo para a cidade,só me lembro do César, o Óscar Gonçalves e o Serafm, Se tivesse fotos, reconstituiria, um pouco melhor o que intento fazer.

Pelo que já disse, apenas 10 nomes aí ficam registados.
Entretanto, vou decidido fazer pressão\ nos ferrolhos da memmória, afim de conseguir, ao menos em parte, realizar o objectivo
Aí vão, pois, algns dentre eles,: António dos Prazeres e
António Portugal, naturais da minha aldeia; José Nunes, de quem
guardo a frase: " Ah! que sorte! Calhou-te o prólego!"
Manuel Pedro Simões, que me ofereceu um casal de pombas, cuja história foi triste; ao mwnos para mom!

O Cabo Prata; João de Sousa Ferreira, cujo pai tem história que sú eu sei contar; Manuel Gomes e Mário Bizarro, que atrasaram um ano; Rogério e Dionísio; Teles Freire e Pinheiro;
Albuquerque e Matos; António F. Pereira; Abel Pereira Delgado;
Martinho de Vila Cova;...Estou paralizado! Que pena eu tenho!

Cinquenta e dois anos pesam assim tanto, na balança do tempo?! 1i9933-1985! É uma longa distância! Quem pode resistir-lhe?!

Um pouquinho atrasado, aí vai mais um; António Cunha Carvalho! Havia outro, de Santa Margarida e mais um, de Freches; Lembra-me também um, vizinho na Capela, o qual tem história que não conto agora! Era a sua graça: Joaquim Mendes dos Santos
Pois, na verdade, muita coisa se olvida, ao longo de meio século! Se todos me lembrassem, deixaria aqui os seus nomes gravados. Entretanto, se alguns me lerem, fica um abraço longo, longo, como a própia distância que deles me separa. Não só abraço, mas viva saudade que punge a alma e fere o peito.

Companheiros amados, que vivestes comigo horas de incerteza, e momentos de dor, como de alegria, se não nos encontrarmos, cá neste mundo, ajusto desde agora um futuro encontro, na Pátria Beleste!.
Que Deus nos ajude a conquistar esse prémio, que fará de nós eleitos do Pai, herdeiros ncessários e habitantes doCéu,

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Lx. Belém
1985-01-08 " Entrar com o pé direito"
É um dos adágios que fizeram carreira, sem perder energia nem mudarem de cor! Há outros semelhantes, bem se deixa ver, o
que sucede amiúde! Assim, por exemplo: Tudo vai do princípio!
De pequenino se torce o pepino! Tudo quer bom começo! Tirar a
casca ao pau, enquanto está quete!

Com mais ou menos rigor, estes breves dizeres, como outros mais, equivalem no sentido. A que propósito vem este caso? Em que circunstâncias? É fácil adivinhar!

Iniciando um trabalho que seja arriscado....ao começar do Ano Novo...na estreia d e um objecto.... em inaugurações... ainda ao princípio de nova carreira. Não têm llimite os casos abrangidos! Tratando-se, realmente, de coisas muito sérias que influem na vida e, por vazes a comandam, há toda a razão, para bem começar!
Em ordem ao facto, requer-se prudência, reflexão profunda,
tacto apurado e certa argúcia. Foi, decerto, com, esta finalidade, que o Céu nos doou uma bela inteligência.

Volvida uma semana, após o início, em ordem ao ano que agora começou ( 1985), urge pensar e fazê-lo com acerto.Um ano a
mais é um passo em frente, rumo à grande meta, que nos aguarda a todos, cá neste mundo. Ao mesmo tempo, representa um dom que Deus nos condede, afim de prepararmos a vida futura.

A nossa existência é um dom do Céu! Ninguém duvida. Se
alguém discorda, nunca reflectiu! Precisa de ler, observar, discernir! Depois, tira conclusões.Pense por si mesmo e não por outrem! Os outros, de facto, podem acertar ou desacerta. É preciso escolhê-los. Há sempre bom e mau! O trigo e o joio! Cabe
a nós distingui-los, para não errarmos, evitando assim angústia e dor.
A quem pertence a vida? A nós é que não! Tanto assim é, que a largamos, sem querer! Só Deus é fonte, origem e princípio de quanto existe!
Sendo isto assim, devo entrar, pois, com o pé direito, quer dizer, com senso e cálculo, juízo e prudência, para não me enganar!
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Lx. Belém
1985-01-09 Um bom Amigo

Escreveu-me há dias, acusando a recepção dum Postal de Boas Festas, por altura do Natal. Gostei fundamente de ler os seus dizeres e as notícias belas que se dugnou enviar-me.

É um padre holandês que trabalha ainda, no Sudoeste Africano,( Namíbia ), não longe de Windoek, cidade capital.
Deixei-o já, vai para 5 anos, mas realmente não posso esquecê-lo,
pelo bem que me fez, numa época adversa.

Saíra, havia pouco, dum vasto campo de refugiados, onde o sofrimento era o pão de cada dia. Ultimamente, ficara no Cuangar, Missão Católica, sita em Angola, juntinho à fronteira com o Sudoeste.
A propósito, faço também honrosa menção do bom Redentorista, reverendo Padre Abílio, que ali nos acolheu, com
toda a paciência e modos cristãos.

Pois aquele (o Padre Manfred ) foi, de facto, o primeiro a dar a mão, quando em terra estranha. Presidia, nesse tempo, à Missão do Capolo tendo por auxiliar o querido Padre Hermes , alemão oriental.
Fora eu contratado por Mr. Burger, Secretário que era da Educação, para ir leccionar m,atéria de Inglês, no Liceu do Katere,
Linus Shashipapo.

A quem recorrer? Onde acolher-me? Na Missão de Nyangana. O padre Baetsen recebeu-me ali, com grande alegria,
à maneira dum irmão. Ofereceu-me hospedagem, pelo tempo necessário (foram 4 anos!), pondo à disposição quanto era preciso.
O Liceu Shashipapo distava apenas 16 quilómetros. A
princípio, ia e vinha, diariamente.Para isso, forneciam gasolina,
sempre que eu pedisse. Quantos favores não fuquei devendo à
Missão Católica ! E não só a esta! Não posso esquecê-las!

Mais tarde já, veio o padre Baetsen para a Casa-Mãe ( Maria
Regina) Daqui me escreveu, agradecendo logo os meus votos de ventura e formulando os seus.
Que feliz me senti, ao ver a sua carta!
Inolvidável Padre! Que Deus te guarde e pague generoso aquilo que me fizeste!
Viva a Holanda que foi o teu berço!

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Lx, Belém
1985-01-10 O Primeiro Berço

Lembro-me bem do que eu utilizei, pois serviu mais tarde para outros irmãos, como era uso e até necessidade. Modesto em extremo, fazia-o confortável a roupa fofinha que apenas as mães
sabem descobrir e logo ajeitar.

Em forma de meia lua, assentando no chão a parte côncava, estava acomodado, maravilhosamente, ao acto de embalar. Carregando-lhe dum lado, ganhava embalagem, continuando os movimentos em ritmo decrescente, caso o deixasse, entregue a si mesmo.

Eu, depois, sendo o mais velho, fui encarregado, muitíssimas vezes, de manter o andamento ao berço de família. Ali me conservava, por tempo indefinido, aré que o bebé se deixasse dormir. Baixadas as pálpebras, logo eu descamsava, Em tal caso, ficava tranquílo: não corria perigo de ser castigado, por desobediência ou por incúria.

Maravilhosos tempos que não olvidei! Pudessem eles voltar! Infelzmente, porém, o tempo leva tudo, seja embora amado!
Esta vida infantil que nos deixa saudades, por causa do amor que reina, à sua volta, nem sempre é bela para todas as crianças!
Falaram-me há dias, aqui em Lisboa, de outro género de berço, que certa mãe já utilizou.

Ao que sei, tem hoje o meúdo 14 anos de idade. Mal viu a luz, se é que ele a viu, pô-lo esta mãe no caixote do lixo. Que tristeza! Fica a gente pasmada, ante casos semelhantes!

Como pode ser uma coisa do género?! Quem mais deve amar é assim que procede?! Pois foi verdade!
A avó, porém, observou de longe e veio logo pelo bebé!

Com extremos de mãe, tirou a criança daquela imundície e levou-a para casa, onde lhe prestou a assistência devida. Nobres sentimentos ela demomstrou!

Uma criança apenas é feliz, dentro do matrimónio, com os pais a assistir! Só deste modo, ela se desenvolve e torna prestável..
De outra maneira, fica gorado todo o seu porvir
Consta-me ainda que o dito jovem odeia a mãe, por lhe haverem dito como ela agiu.
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Lx. Belém
1985-o1-11
O Primeiro Beijo

Tema sugestivo?
Sem dúvida nenhuma! Um campo aberto, largo, infindável,onde a gente se perde e é capaz de imaginar o que outrem não julga!
Viria a propósito dizer o que é o beijo e pode também significar, indicando, ao mesmo tempo, as várias espécies.

Entretanto, não é isso, exactamente, o que agora me preocupa: só
aspectos gerais e muito ao de leve.

O primeiro de todos, cronologicamemte é aquele que irrompe da mãe exremosa, após o nascimento do seu primeiro filho. Não posso descrevê-lo, com todo o rigor, mas conjecturo que há-de ser eomocionante! Fruto dum amor, ainda não desbotado, mas vivo e ardente, apaixonado e forte, vem a ser a criança uma viva afirmação desses laços poderosos que unem dois seres.

É, por assim dizer, a flama subtil da fogueira crepitante.
Fantasias e sonhos, projectos e cálculos, tudo ali medra,
embora em miniatura.
Aquele ser pequenino, florido botão, traz em seus olhos um mundo de promessas: umas, de presente; outras, de futuro.

Há dois corações que batem a uníssono; duas almas belas que ue logo se abrem, para tornar em éden o ambiente do
pimpolho. Ele aí se encontra! Indiferente e apático, insensível ainda e quase mudo!
Um dia, porém, há-de ele explodir como julgam os pais, em amor e gratidão! E a vida transforma-se àqueles pensamentos e longos devaneios. Tudo se permite , nada havendo ali que seja intolerável.
O petizinho vira deste modo, em razão de ser para os pais extasiados! Fora esperado, com grande ansiedade! Qiantas noites veladas e horas de expectativa! Que momentos inquietantes e receios temerosos!
Mas Deus ajuda: o pimpolho surgiu e um beijo puro, ardente e longo se fez logo ouvir, na estância feliz!

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Lx, Belém
1985-01-12 Cont,
Comecei por um tema que, na verdade, não estava previsto.
Embora, realmente, fosse despertado, veio a protósito.Há pouco ainda, convesando, na Amadora, com pessoas amigas, relataram-me um caso que serviu de rastilho para o Diário precedente. Nele, deixei algo, proporcionado agora pelo primeiro beijo e os vários sentimentos que lhe andam em torno.

Foi desluzido quanto escrevi, pois não acho palavras que venham expressar tão grande ventura!. Por outro lado, apenas a mãe é capaz de o fazer, pois o sente a fundo. Entretanto, uma coisa é sentir , outra revelar, por maneira devida, ou seja, comunicar, a
outra pessoa aquilo que viveu e a fez ditosa.

Apesar de tudo, empenhei-me no assunto que fundo me agita, impressionando por forma inusitada. Agora, porém, vem a face amargosa. Toda a medalha tem o seu reverso! Atendamos, pois, à face repugnante! Também o ouro perde, âs vezes, o brilho! Isto, no entanto, faz mais atraente,desejado e cubiçoso o que é verdadeiro!
Relataram-me um caso ( estremeço de horror, só de o lembrar!) ocorrido há pouco, em que o belo amor se mostra ferino! Aquela que mais ama seus próprios filhos, e é fonte genuína de amor sacrificado, ina lterável e puro, surge-nos ali bem pior que uma fera!

No Diário 1o, já toquei de raspão, neste caso infando!
Aih! Lembro-me bem! Na selva da Namíbia, quantas vezes o notei! Os temíveis quadrúpedes acariciavam seus filhos, com todo o enlevo! Quantos cuidados! Que lutas heróicas, em sua defesa! Que lutas longas, persistentes e duráveis , para obter o seu alimento!
Com rosto humano, houve entre nós, algures em Portugal,
um facto hediondo, repugnante, detestável!
Uma mãe carniceira põe no mundo uma criança! Uma menina, ao que dizem, linda como o Sol e dá-lhe como beijo, um aperto na garganta! Depois, atira-a, sem escrúpulo, para o caixote do lixo!
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Lx. Belém
1985-01-13 Uma Carta - Horrendo Monstro: Tem esta por fim alertar a consciência, para veres melhor o caminho que trilhas, evitando assim a maior desventura. Dou este nome à eterna perdição, pós esta vida.

Ignoro quem sejas, pois nunca te vi nem provavelmente o
caso difere, na tua pessoa, em ordem a mim.
Embora seja assim, já sei o bastante,, para ajuizar, acerca de ti e dos teus sentmentos. És um ser humano, pois tens um rosto, como as outras mulheres! Andas e agitas-te corres e avanças... não paras jamais!,
Atiras-te, impensada nos braçoa da vergonha e do maior dsecrédito. Nada te im+prta o que os outros digam. Oensaráas até que ninguém observou e, por essa razão, não pofem condenar~te!

Aqui em baixo, julgo-te eu já, para condenar-te à pena maior. Faço-o prontamente, em nome da Humanidade, constituindo-me juiz da inocência calcada! És mulher, sim, autora
cobarde e, ao mesmo tempo, desonra infamante do saxoo feminino!
Terás tudo, penso eu, o que têm as outras. Entretanto, duvido seriamente que tenhas coração! Se leres acaso este meu Diário, fica já sabendo que represento aqui a própria Humanidade e peço a Deus que julgue o teu crime. Ninguém viu? Isso julgas tu!
Ignoras, por ventura, que Deus sabe tudo e vê o que de passa no mais íntimo recesso de cada um?" As palavras escaldantes que o C+eu proferiu, à morte de Abel, levada a efeito por seu irmão Caim, vão soar a teus ouvidos: " O sangue de teu irmão clama da Terra por mim! "
Ainda as não ouviste? Dá grande atenção, que precisas já de arrepiar caminho! Esganaste a inocente, praticando um crime que não tem perdão, cá neste mundo! Se tens coração, nesse peito imundo,roga a Deus.Pai qur o venha purificar e pede-lhe perdão!
É tempo ainda. Não deixes passar esta opotunidade

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Lx. Belém
1985-01-14 Outra Carta
Amorzinho: Não te beijou o monstro
horrendo que foi tua mãe.Em vez de amor, revelou, pronto, ódio figadal à tua existência. Concebeu-te em pecado, fora do lar e de bons princípios!
Apenas o diabo a soprar-lhe ao ouvido, com promessas falsas e lisongeiras de prazer e doçura! Deleitou.se carnalmente,
ao jeito dos animais e depois concebeu-te num seio de imndície.

Às vezes, dá-se igual caso, mas acolhem jubilosas o fruto de seu ventre, amamentando o ser inocente, que veio à luz sem culpa nrnhuma. Em tais circunstâncias, o mundo perdoa, que é belo e honroso amparar os inocentes!

Fica sempre bem a qualquer mulher defender com energia a vida incipiente do ser que gerou.
Tu, porém, cara inocente, como foste desditosa! Que pena eu tenho da tua desventura!
Julgo, convicto. há-de ser execranda essa horrível situação!

Nem tenho palavras que possam definir a suprema desgraça de mães como a tua! Ao mesmo tempo, o acto de agressão, desumano e cruel de que foste vítima, enche-me de espanto e grande confusão, ante o crime nefando que te privou da existência.
Aquele beijo terno que havia de aplicar-se, em teu rosto inocente e que não recebeste, cá neste mumdo,aplico-to eu, a
título póstumo.
Quem me dera beijar-te, em pura realidade!!

Pudesse eu antecipar-me àquela que te esganou e arrancar-te
logo de de suas mãos assassinas, evitando esse crime!
Mas olha bem: inocente como és, farás companhia, lá nas Alturas,
a outros inocentes que Deus acarinha!

Nessa Pátria bela, onde o ódio se apaga e só reina o amor, roga ao Pai do Céu que tua mãe se converta.

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Lx. Belém
1985-01-15 Coisa Irreal?
O que tenho em mente é agora o namoro.Que vem a ser, afinal, o chamado namoro? Ou então, melhor ainda: que devia ser o acto em cauda?Um tempo sgradável, mais ou menos longo., em que dois jovens (ele e ela) gostam de encontrar-se, afim de conversar e trcar impressões, tentando cada um ilidir o outro?

Devia ser antes, em boa verdade, um estudo a sério. tendo por fim o conhecimento de ambas as partes. Só deste modo pode haver felicidade, pois será deduzida a conclusão certa.
Pelos dados expostos, logo de princípio, é o tal namoro uma coisa irreal. Sendo, pçpois, assim, é tempo inútil!Se fora só isto, havia ja prajuízo. bem entendido, mas a coisa pior está para vir.

Que podemos esperar, de semente caninha? E de plantas más? Bons frutos é que não! A falta de verdade e sinceridade vai por
certo induzie em erro fatal! Fingir grandeza, espírito de eleição,
influência e bondade é certamente passar gato por lebre!.

Bom. Tratando-se, afinal, de preparação para o matrimónio,
que há-de ser objecto de grande serirdade, requer-se decerto, ponderação e calma, verdade e transparência.

Não sendo possível descer à realidade, em pouco tempo, é
conveniente aguardar então o que fue for preciso. Quem o não fizer será transportado pela imaginação a campos daninhos!

Ideal há.de ser aguardar paciente que deixe de existir a 'cristalização'. Esta mais nada faz que ver qualidades na pessoa
amada, chegando ao ponto de tornar bom aquilo que é mau.
Em tal caso, é o namoro uma coisa irreal! Diria até, muito perigosa!
Não teremos ali a razão de ser de muitas deserções?
Façamos, pois, que haja realismo, compreensão e honestidade.
Além disso, banir do diálogo quualquer fantasia ou algo dudpeitoso.
Que valor pode ter o namoro em causa? Nenhom, decerto,
já que sai da fatasia!
O recurso a Deus é imprescindível: com Ele vem a luz, a
serenidade e a paz dourada!

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Lx.Belém
1985-01-16 Que vale o Namoro!
O valor duma coisa preocupa a gente. Mão admira nada que seja deste modo, pois há realidades que são basilares, mercê da utilidade que têm para nós, já neste mundo, já no além-túmulo.

Tanto assim é, que perguntamos sempre: valerá bem a pena?
É que o homemperegrino, afim de viver, podendo realizar-se, precisa da matéria e ses derivados. O interesse, pois, encontra-se na base das nossas acções: actua na vida, como incentivo a que todos obedecem.
No campo intelectual, verifica-se o mesmo r, bem assum, na esfera religiosa. Ainda que a utilidade resisa tão só mo mesmo prazer, é já suficiente, para dar impuldo e levar ao esforço.

Postos assim estes preliminares, convém desde já fazer a pergunta, extensiva ao namoro: que valor terá ele?
No caso em foco, há duas realidades a tomar em conta : o agrado
em si e a utilidade
O primeiro aspecto é indiscutível. Se não agradasse, ninguém o admitia. Acolhido por alguém, é que ele dá prazer,
com toda a certeza!

Ainda neste campo há conveniência, agindo com argúcia.
Efectivaente, pode suceder que haja enorme gosto e, ao mesmo tempo, dano tremendo. Por isso, hã.de intervir o exame prévio,
onde a prudência usará da palavra. Na verdade, se algo dá prazer,
mas causa transtorno de natureza gtave, já na ordem físuca, já na
moral, deve postergar-se, renunciando prestes,ao deleite previsto

Cabe agora a vez ao outro quesito - a utilidade.
Será ele, de facto, útil. a valer?! Para bem avaliarmos esta exigência, devemos olhar à sua finalidade: estudo sério, meticuloso e ponderado, com vista ao matrimónio.

Tratando-se, afinal, duma santa uião, tão longa como a vida e que tem projecção, cá neste mundo e na eternidade, há-de haver escrúpulo, na sua preparação, Requer-se tempo ( ao menos seis meses).nobreza de sentimentos, abertura completa, responsabilidade, crença firme em Deus e nos seus mistérios, recurso à prece e desejo imenso de acertar o passo.

Para que tudo venha a dar certo, é lançar mão de todosos os meios. Procedendo assim, não hesito em dizer que vai ter bom
êxito, representando o namoro a escora firme do futuro matrimónio. Havendo, porém, falta de lisura e comandando a tola vaidade, o inchado orgulho, a deslealdade, egoísmo soez e falta de honestidade... que valor pode ter?!

É uma escada perigosa que leva ao precipício. Está em nossa mão fazer do namoro um recurso admirável, que garanta a paz, a boa harmonia e total compreensão, no futuro do lar.
Sendo tudo ao invés, como infelizmente. sucede muitas vezes, origina a catástrofe: separações, lares destroçados, infelicidade, pranto e agonia.
Neste caso, o namoro é falso, perigoso, abominável! Não tem valor nenhum! Mais: é um dado negativo!

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Lx. Belém
1985-01-17 Uma Carta em Fátima.

O género literário, dito epistolar, segundo o uso corrente,, exprime a verdade. Efectivamente, é uma das notas, mais em evidência afastando-se, pois, do Romance e da Novela bem como do conto, onde entra sempre muito de fantasia.
Este género abrange vários ramos que não vou apresentar, uma vez que não é esse o meu objectivo. O mais comum de todos é o familiar,que apresenta assuntos da vida e do lar,expostos, já se vê, de maneira simples, atraente e exacta.

Desejando conhrcer, por modo cabal, qualquer escritor, a que vamos ater-nos?. São as cartas, na verdade, que nos dão o retrato, com todo o rigor. A carta,porém, de que agora me ocupo, trata um assunto, de carácter íntimo, com projecção, moral e santa..

Não foi, decerto, que eu a violasse ou ainda a obtivesse, por meios ilícitos. O caso em foco relatou-o alguém, cujo nome oculto, mas ainda vive e participou, no desenrolar da cena. Era, pois, em Fátimo, ao tempo do casamento.

Dois jovens enamorados, com alma de artistas e nobres ideais, unem seus destinos, ante a imagem da Virgem, a quem se entregam, para que ela os guie, ampare e defenda, nas lutas violentas que a vida nova lhes vai proporcionar.

Decorreu já quase meio século. Esse dia, no entanto, jamais esqueceria! Presente a seu esp+irito, foi luz diamantina a iluminar, dia a dia, os caminhos da vida!

Os recém-casados anteviam os problemas e graves dificuldades que teriam de enfrentar. Sen auxílio do Ceu, podiam eles ter êxito?! Sabiam que não! A experiência amarga, os casos observados e os factos diversos, narrados em livros, eram boa lição!
Postos assim, perante o matrimónio, querendo acertar, para haver bom êxito, vem-lhes uma ideia que logo abraçam e concretizam: escreve ele uma carta, dirigida à Virgem, onde expõe a sua crença, o ideal que o domina e quer realizar, terminando com um voto: não cometer jamais um pecado mortal!

Para tanto, confiavam na Senhora e ficavam disponíveis, generosos e prontos, sob a influência do Espírito Santo.
Parece talvez um conto de fadas?! Entretanto, não é! Trata-se, afinal dum facto verídico, passado há anos, das minhas relações. Por vezes, surgem destes casos que nos deixam banzados! A realidade aqui iguala a fantasia!

Ainda encontramos, na sociedade moderna, factos modelares... almas de elição... corações generosos, espíritos selectos! Essa carta, após a assinatura, foi logo encerrada, no cofre da Virgem, a quem era dirigida e a cujo patrocínio eles se confiavam

Que lição maravilhosa para a nossa época!
Em nossos dias, os casais desunem-se e fogem logo, por motivos banais! Aquele, porém, foi sempre firme, cumprindo, a rigor, o que haviam jurado, em frente do altar!

Ele faleceu, há pouco ainda, mas deixou o seu exemplo que é luz disasntina, a fazer claridade, em nossos caminhos!
A esta hora, já Deus o recompensou de tão alto ideal, vivido a fundo, enquanto a Virgem há-de ter sorrido. com ar de bondade e extremos de Mãe!
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Lx. Belém
1985- 01-18 Junto da Cama
Aquela personagem a quem aludi, é também protagonista da cena a contar. Melhor diria talvez: as duas personagens.. Com efeito, ambas tomaram parte no facto ímpar que me proponho tratar.
A noite de núpcias é, naturalmente, cheia de ansiedade,estonteamento e grande alvoroço! ( caso se hajam respeitado!) O ser humano é dado a isto, quando, na verdade,
há interesse premente, desejo insaciável, amor ardente e grande paixão.
É natural! Entretanto, como se trata de seres racionais, o seu actuar há-de ser diferente, se temos em conta os irracionais. A origem do homem , seus deveres sagrados e o destino eterno, pendente, a rigor, do seu comportamento, levam por força a dirigir seus actos, num sentido nobre., alto e fecundo.
Apesar de tudo, o próprio estonteamento irá impedir a séria
reflexão.
Com este casal, o facto não se deu.Um dentre eles foi quem mo referiu. Antes de mais, como preparação para a vida conjugal, que traz benefícios e bens incalculáveis, mas em simultâneo, pesados encargos e grandes sacrifícios, realiza-se no
quarto, junto da cama. um acto religioso.

Eles os dois, em extremo concentrados e harto desejosos de cumprir os seus deveres, como Deus quer e de todos exige, ajoelham fervorosos, rogando ao Senhor, por intermédio da Virgem-Mãe, abençoe para sempre todo o seu agir, encaminhando-o prestes, no sentido exacto, requerido por Deus.
Uma cena esplendorosa, cheia de sentimento, religiosidade,
consciência delicada e sentido profundo que a vida humana tem,
para cada um!
Não posso deixar de curvar-me, reverente,, ante o facto belo, que então se realizou! Quem assim começa há-de ser feliz,
após a morte, na vida futura. Assim foi, de facto. Houve compreensão, harmonia e paz, entre eles ambos.

Quase 5o anos a viver em comum a vida quotidiana, com seus graves problemas, altos e baixos, jamais um desmancho que proviesse dali! Dificuldades várias, mas de outra ordem! Espinhos e abrolhos permite-os Deus, àqueles que ama, para que tenham ensejo de mais se alindar, com vista directa à glória eterna

Quem dera, na verdade, que o mundo em geral, copiasse este exemplo: colocar Deus, em nossa própria vida, para que Ele a impregne, abençoe e fecunde! Haverá aí poder que se oponha e contrarie, quando o Céu ´é quem vela pelo mísero ser?!

Alguma vez pensaram em faltar ao compromisso que o Ministro do Senhor recebeu de seus lábios?! Nunca! O Céu os protegia, velando pelose bom exemplo, numa sociedade, já materializada e alheia, por certo, a grandes realidades, que não podem ignorsr-se! Primeiro, Deus! Só depois, a criatura!
Qualquer acção há-de ter como base, finalidade e alvo
quem nos criou, remiu e salvou.

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Lx. Belém
1985-01-19 "Se não fosses tu, já me tinha suicidado!"
Aquela meúda so tinha 12 anos! Agora ainda, pouco mais há-de ter! Com esta idade, já farta de viver?! Não é esse o caso!
A questão é outra! As circunstâncias da vida, quer dizer, a situação lastimosa, em que a mãe se encontra, é que
realmente se torna responsável pelo sucedido!

Nem outra coisa era de esperar! Efectivamente, aos 12 anos apenas, com um lar amoroso, embalando a existência, não pode, realmente haver tais ideias! É a adolescência que opera ainda,esteja ela embora a despedir-se já, para logo entrar a puberdade!
Entretanto, as más relações, entre pai e mãe, é que geram, na verdade, tal situação!
Lembra-me agora a obra curiosa de Paul Bourget - Un Divorce - onde se expõem, devidamente, as consequências, harto nefastas, que origina, de facto, a separação.

São os filhos, na verdade, quem sofre a tragédia, em toda a extensão e profundidade. Só esta razão devia ser bastante, para levar os pais a profunda reflexão, antes de avançar, para fora dr órbita.
No caso apontado, ainda nao havia divórcio projectado nem separação , embora fosse emergindo, de um dia para o outro!
A pequena é filha única e ama igualmente o pai e a mãe.
Esta, a rigor, vive sozinha, pois a isso não obstam as visitas do marido, uma vez por outra.

Em tais circunstâncias, é deveras triste a existência da mãe que,naturalmente, exerce influência no espírito da filha.
Quantas vezes, afinal, não irá surpreendê-la, com lágrimas nos olhos?! Quantas outras ainda, num longo cismar, que entra pela noite e se prolonga, talvez, pelo dia seguinte?!
O autor de seus dias vive realmente com outra mulher,
exigindo embora que a esposa traída lhe seja fiel! Devido, no entanto, aos princípios religiosos e ao grande sentido que ela tem de honestidade, mantém-se fiel. o que não vai obstar a que seja infeliz!
Resultado?
Margarida, vendo o que se passa, tudo regista. Que lhe dizem as colegas da Escola Preparatória?Qual a sua reacção, vendo as amigas, no lar adorado, onde coabitam os pais extremosos?!

Perguntará, decerto, aos seus botões: "Mas porquê?! Apenas a mim é que a sorte enjeitou?! Que mal fiz eu?! Por que não ter aqui, debaixo do mesmo tecto, aquele e aquela que tanto amo e prezo?!"
Sob o influxo de tais pensamentos, a alma da criança fica retalhada! O traumatismo apodera-se dela! Não pode fazer-lhe frente! É um caso à-parte! Não ser igual às outras! Elas, realmente, é que são ditosas! Dois amores que se juntam, reforçando a união com provas e mostras de afecto e carinho!

Este, em seguida, pelo mero facto de extravazar, torna ditosos os filhos queridos!
De tudo isto sai prstes a negra conclusão: "Só comigo, afinal, se passam as coisas de forma lastimosa!"
Vem então o desabafo, atirado assim forte, à cara da avó, que adora e preza: "Se não fosses tu, já me tinha suicidado!"
É um grito de alma que gera calafrios, em peitos sensíveis!
Será que o pai não se deixa tocar por aquela voz, assim angustiosa?!
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Lx. Belém
1985-01-20 Saber pedir.

Pedir, neste mundo , é tarefa dura, quaisquer que sejam os casos da vida. Representa sujeição, enorme dependência, escravização, ainda que o façamos, em benefício de outrem!

Implica renúncia, recalcamento e, quantas vezes, não 'e já sinal de grande incompetência! Para não haver o que é necessário, precedeu talvez condenável indolência, enorme incúria, falta de tacto e falha de cálculo! Diversas, acaso, as causas do mal e de certas carências!

Dado até que não haja culpa, ainda então o acto de pedir
é algo humilhante ! Quantas respostas, angustiando a alma, que agoniza e geme, em lento penar! Apesar de tudo, a maneira de agir, em casos do género, tem suma importância ,na vida habitual!
Fazê-lo sem finura,destreza e jeito, é sempre arriscado!
Aguentar-se alguém, ante modos arrogantes, cabeça direita e
jeito molesto, que vai dar, afinal?! Funda reacção nega formal
decida e pronta!

O caso de há pouco, ocorrido entre mim e simpática velhinha, levou-me a pensar! Efectivamente, devido à hora, que estava chegada, não podia atendê-la. Era domingo e a tarefa urgia! Tinha as horas contadas! Qualquer atraso me poria em brasas! Sendo isto assim, não havia, de facto, ensejo algum de voltar atrás!
À minha recusa. expressa embora com gentileza, apresentando razões, não se desconcerta a boa velhinha! Amável em extremo, expõe o seu caso, com maneiras tocantes.

" Tenho 93 anos! Ainda vou andando, mas para vir à igreja, só acompanhada! A famíilia não me deixa! Tenha pena de mim, querido senhor! É só um bocadinho que rouba às suas horas! Olhe que é o mesmo que livrar do Purgatório uma alminha! Não hesite! Pela sua mãezinha que terá com certeza, não me deixe assim, entenebrecida!"

A velhinha falou, pondo na voz acentos de ternura, Não pude resistir! Sorri para ela, desejando beijá-la e disse-lhe pronto: senta-se aqui, nesta cadeira, que eu vou atendê-la em breve espaço!
Assim foi, na verdade! Ela, por sua vez, foi toda amabilidade!, não tendo palavras, para ali agradecer!

Por minha parte, não fiquei atrás, em júbilo sincero.
Um acto bom, feito para mais, sem interesse, deixa atrás de si
um raio de luz. E se pomos no Céu os olhos da Terra?Então, sim! A luz diamantina dum acto assim, feito por caridade...
Bom. O facto passou. Entretanto, jamais se apagará da minha memória! Fiquei embalado pela grande beleza daquela acção, É que a velhinha soube pedir e fê-lo com tal jeito ,que logo me virou!
Houve, no entanto, certo pormenor, que me afectou em extremo: fez-me lembrar outra boa velhinha que era minha mãe, falecida já, havia 20 anos! Só tinha mais 4!
Se fosse viva,era assim bondosa, querida e meiguinha!

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Lx. Belém
1985-01-21 Quando casar?

Momentoso problema, que é, na verdade, origem de cuidados e grande apreensão! De maneira geral, qualquer fase da vida é apropriada, a partir, já se vê, da idade legal.Efectivamente, vemo-lo na prática, há circunstâcias de variada ordem, a que, realmente, não podemos fugir e que fazem alterar a marcha das coisas.
Umas vezes, surpreende a viuvez; outras vezes, a mudança de rumo; outras ainda, causas imprevistas de natureza diversa. Portanto, o matrimónio pode realizar-se em
qualquer altura, de harmonia com os dados que cercam alguém,
Pondo-se a questão em bases diferentes, é outra a resposta. Quando será, em boa verdade, mais apropriado, fazer a ligação por matrimónio? Teoricamente, há-de ser preferível numa época da vida, em que haja entusiasmo, sonhos e castelos, erguidos na fantasia. Há-de ser num tempo,
em que tudo sorria, mostrando-se formoso... em fase maravilhosa que traga promessas, ilusões e flores. Um período festivo, em que reine a euforia.
O fogo das paixões é mais vivo e intenso, na juventude, será, pois conveniente orientar as coisas, em tal sentido.

De modo nenhum, deverá realizar-se, antes de alguém haver atingido a maturidade. Acções de peso exigem de nós grande sensatez. Ora, o casamento é acção muito séria, pelas graves sequelas que pode originar. Por estas razões e também por outras, como seja, de facto, a plena maturidade, física e psíquica, entre os 22 e 25 anos!
Isto, como lei geral. Certas funções poderão, realmente, exigir mais idade.
Sabemos que a jovem é mulher acabada, aos 22 anos bem como o jovem, aos 25.

Em tais idades, enriquece-se breve a leve fantasia e apresenta-se o mundo com belo cariz.
Faltam ainda os grandes entalões e a amarga experiência, que
endurecem o homem e o tornam diferente.

Vários casamentos não têm provado, por forma desejável. Qual a razão?
Pode haver, no geral, mais do que um motivo: diferença na idade, na maneira de sentir, querer e projectar; mentalidade, um tanto enfezada, obsoleta e parada.

Os anos de vida fazem alterar a maneira de ver. Por isso, nada há como serem os dois da mesma época.

Tudo quer o seu tempo! Vamos nós, por ventura, esperar frutos, ao longo do Inverno?! Queremos entusiasmo, entrega e confiança, na idade madura? Exigimos entusiasmo, quando já se percorre a outra vertente?!
O fogo das paixões, a fantasia, harto sonhadora, a euforia da vida e a grande confiança que ela instila em nós?!
Passada a época, já não tem graça nem pode originar a ventura esperada!

Não havendo travão, os nossos jovens lançam-se prestes na grande aventura, sem olhar a desaires nem considerandos.
Como fruto da época há-de ser maravilhoso! É esta, realmente a melhor garantia de êxito cabal.

Se não houver ainda maturidade bastante, por causas diversas, estranhas à pessoa, é conveniente protelar o casamento ou a vida religiosa, estudando a valer o caso pessoal.
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Lx. Belém
1985-01-22 Uma do Inácio

!Já de outras vezes a ele mereferi. Trata-se, pois, dum
caboverdiano, que trabalha em Lisboa, na igreja de Alcântara.
É já casado e tem a seu cargo belas crianças. Não quero repetir o que já escrevi, em Diários passados! Seria malhar em centeio verde ou " chover no milhado. Algo, no entanto, Algo. no entanto, existe de novo, sobre o qual vou já pronunciar.-me.
Falava eu, sobre um caso impressionante, por mim observado: ligação matrimonial entre um branco, meu amigo,
e uma jovem ilhé, natural de Cabo Verde.

Como era da sua terra, prestou mais atenção, deixando-me falar, até me expsndir, a bel-prazer!
Ouviu, ouviu, fazendo seu juízo, até que, por fim, remata como segue: " Nunca dá certo! Europeu com Africana ou
vice-versa, não joga bem!"

Detive.me ali, observando bem, com toda a minudência,
prestamdo-se ele a juntar razões que pudessem convenvencer-me. Achei-lhe muita graça, por ele ser casado com uma branca, natural do Fundão.

"Nunca dá certo!"
Meditei e persisti, querendo então ouvir algumas razões, Antes disso, fez ele a pergunta: porquê?!

Alarguei-me, depois, em considerações, o que o levou
em seguida a mais considerandos.
Dizia-lhe eu:
-- Olhe, Inácio, a principio, era tudo lindo! Havia beijos aos centos, olhares insinuantes, palavras mimosas e cheias de requebros. Entretanto, os dias passavam e, como ela, por desgraça, não sabia fazer nada,.. nem sequer vestir-se, aumentavam as despesas, faltando o dinheiro! Era a porta aberta para a longa tragédia!

Surgiram as discórdias, palavras jã fortes e maneiras agressivas! A lua de mel expirava, em seguida! Ascores vivas e os sonhos dourados ... tudo, num credo, ficou em nada!

O mundo era outro! Faltava o dinheiro para os gastos diários! Atrás disso, alguns desvios, já comprometedores!
Seguem os ralhos... vem a desarmonia... chegam as sevícias!
O rendimento não dá, que tudo em casa é feito por outrem!
Era o abismo! Para chegar ao fundo nada já faltava!
Perdido o afecto e exacerbada a má vontade, vem acto breve,
o rancor e a fúria! Resultado?

Separam-se para sempre! Ela, decepcionada, regresss à terra natal, o belo Arquipélago de Cabo Verde! Ele permaece, mas
vira outro homem!

De jovem cavalheiro, inteligente e culto faz-se borracho,
banai e inútil! Estava perdido!
Ante o facto exposto, o jovem Inácio remata, convicto: "Hábitos diferentes, maneiras de ver, agir e pensar, ambiente e clima, pessoas e lugares... tudo o que aí fica e mais o que falta não eixa, realmente, lugar propício a tais casamentos!

É, pois, escusado, conclui o Inácio! Nunca dá certo!
Os Africanos com Africanas; as Africanas com Africanos; Europeus com Europeias; e assim por diante...

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Lx. Belém
1985-01-23 Um Embrulho

Faz impressão deparar-se à gente um embrulho qualquer! Pelo simples facto de estar envolvido, aumenta logo a curiosidade, que se vê espicaçada. exigindo em breve plena satisfação.
Muitas vezes, é causa forte de enormw alegria; outras, porém, redundam os factos em enorme decepção. Destes últomos, registo dois outros, que ficaram para sempre gravados na memória.

Refiro-me, desde já, ao mais recuado, no tempo e no espaço.Era eu estudante. lá no Fundão,onde tinha iniciado os Preparatórios ( curso geral dos Liceus), os quais se prolongaram de 1933 a 1937.

De vez em quando, mercê de feriados ou festas especiais, dávamos passeios, bastante a nosso gosto, visitando as aldeias e subindo animados à Serra da Gardunha.

Numa destas abaladas, passando por Alcongosta, a caminho das alturas, observámos as gentes, olhando curiosas pellas janelas,, enquanto em baixo, no rés-do-chão, dispunham outros as vergas tenras, para fazer cestas e outros recipientes.

Ruas havia que exigiam cuidados, ao pôr no chão qualquer dos pés. Erguiam-se monticulos de certo produto, cujo nome oculto, por
decência e respeito. Hoje, creio seja diferente! Já lá vai meio século!
Bom. Ali, quer dizer, nos tais erruamentos, acautelava,se a gente
que o perigo em causa achava-se à vista.

Quando,porém, ele está oculto?! Pois foi o caso: avistando o Martinho, colega de curso,( já falecido) um pequeno embrulho- na berma do caminho, quis mostrar logo seus altos dotes num desporto conhecido - o futebol!
Levado pelo impulso, que já irradiava, de seu peito ardente, atira-lhe um chuto, decidido e pronto! Eis senão quando o papel se desata, rompendo-se todo, pelo que deixa à mostra o produto nauseabundo! O pior não foi isso!
O pobre Martinho que levava,nessedia umas calças novas,, observa, com tristeza e forte desalento, que estavam salpicadas, a toda a extensão!
Expansivi embora e todo euforia, perde a coragem, gorando-se o passeio!
Saudoso Martinho, que lá no outro mundo, sejas mais feliz do que neste, onde vivo!
O segundo embrulho de que vou falar, é de outra natureza. Perdoe o leitor citá-lo agora, mas vem a talho de foice
Era num templo, algures em Lisboa. Lá quase ao fundo, uma jovem-mãe sustentava nos braços um volume não pesado. Uma vez por outra,
virava-o ela, com muito jeitinho, dando a impressão de o ter em conta
e muito apreciar!
Chamava as atenções a posição da jovem assim como os trejeitos que estava fazendo. Todo o seu mundo se encontrava ali, suspenso nos braços. Envolvido em panos, velava-se o conteúdo.

Perguntei logo aos meus botões: que vem a ser afinal?! Talvez uma oferta para o Grande Senhor?! Um presete ao Altíssimo?!
Era, de facto, um rico tesouro! O seu primeiro filho? Oferenda ao ao Senhor?
Ainda há mães assim piedosas que fiam do Céu a ventura de seus filhos!
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Lx. Belém
1985-01-24
Outro Embrulho

São embrulhos a mais - alguém dirá. Vou nas mesmas águas! Que hei-de eu fazer?! Se eles mesurgem, por aqui e por além,
provocando assombro! Entretanto, se às vezes me saio mal, nem sempre acontece!
Em certa vila do nosso país, ( se oculto o nome, é por deferência) corria açodado, fugindo à chuva. Para tanto, lançara-me breve por um atalho, junto ao ribeiro, dando-me parabéns, pelo recurso
Se eu me lembrasse do rifão português:"Quem se mete por atalhos, nunca lhe faltam trabalhos!".... Mas quê?! Só tardiamente é que os tais anexins vêm ao de cima!

Bem. Sigo diligente, socorrendo-me ali do guarda-chuva e dizedo satisfeito para os meus botões: por aqui é um regalo! Encurto, a rigor, metade do daminho! A sabedoria antiga do nosso povo tem artes para tudo! Até diz assim; Quando menos se esperam é que elas acontecem!

Foi exactamente o que veio a suceder!
No melhor da festa, enquanto me esgueirava, de chapéu aberto,sinto um ruído, na frente de mim, Fico assustado e em grande alvoroço.Nao que eu seja timorato! Nunca o fui.

Apesar de tudo, naquela circunstância... Ia apressado, não
contando ali com algo semelhante, Depois, a proximidade... Por pouco não roçou na minha orelha!

Fosse, na verdade, almofada sedosa ou aveludada não
estranharia! Quanto a desgaste, que podia fazer?! Nada ou quase nada! O certo, porém, é que era pesado, avaliando então pelo forte embate no meu guarda-chuva! Se não era este, que poderia ali haver-me acontecido?!

Perguntarão, talvez, o tipo de conteúd? Pois tenham
paciência, que não vou dizer-lho, se bem que eu saiba!
Efectivamente, ao dar no chão, desatou-se o invólucro e...
pronto! Ficou logo patente o que era nauseabundo e seguia pelos ares, à maneira de torpedo!

Do que eu me livrei! Algum amigo pedia por mim, nessa hora trágica! Que seria, pois, da minha vida, ante aquela humilhação?! Ficaria menos homem! Se, ao menos prevenissem, como era uso, na Idade-Média! Pois não diziam:"água vai?!"
Deste modo, acautelavam-se as gentes, evitando mau cheiro e embates molestos.
Apesar de tudo, aquele embrulho que sugeriu este pobre Diário e foi tratado antes, era muito diferente!Um volumazinh bastante diminuto, sustido amorosamente nos braços duma jovem!

Presenciando a cena, detive-me ali, por tempo ilimitado. Era comonum feitiço! A extrema leveza de seus movimentos, o ar de satisfação, o júbilo desbordante, a tentativa de fecunda mudança, a ânsia de perfeição, o desejo ardente de ser útil a alguém que gerara em seu ventre, davam logo asas, à quente fantasia!
Como deve ser belo o coração de uma mãe! É mais belo ainda o Coração do Senhor que faz coisas assim!

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Lx. Belém
1985-01-25
" Passaram a haver razões...!"

Já versei este assunto, em outros Diários. Apesar de tudo, a insistência porfiada, em certos locutores da nossa televisão,
obriga-me sempre a baixar à liça. Cá estou, pois, de varapau na mão, para dar apoio à Língua Nacional!

Bati-me sempre, com alto denodo, por esta causa! De modo nenhum eu vou permitir, a foças que eu tenha, venham manchá-la pessoas negligentes, descuidadas ou incultas. Além do mais, é um aspecto grave, que se encontra em causa: a Sintaxe Portuguesa!

Quer isto dizer, com toda a propriedade, que o idioma nacional fica atingido, na própria alma! É o que se chama degenerescência, a total destruição, o fim lastimoso! Isto
exactamente, é o que eu não quero.

Vejamos, pois, em grande pormenor, onde é que foi vibrado o terrível golpe!
O verbo haver vem directamente do latino "habere" que
significa haver, ter ou existir.
Como verbo transitivo ainda se usa, embora não muito ( as magras provas que João havia dado...) eram, de facto, insuficientes. Entretanto, nesta ac epção é de uso restrito.

Por ser transitivo, na Língua latina, veio depois a seguinte análise, tradicional: predicado: há; sujeito: inexistente; complemento directo:homens.
Acho parvoíce dizer alguém que não há sujeito, Afigura-se absurdo! Quando assim não acontece, indica o verbo o que ele é ou então como é: o Sol é um stro; o Sol é benéfico
Tal verbo, porém, usa-se hoje como intransitivo, significando existir: há homens cruéis.
Predicado: há; sujeito: homens
Nesta acepção, usa-se apenas na 3ª pessoa do singular: há casos tre mendos! Ha burros a valer

Em tal acepção, passou o verbo haver a substituir "sum"da Língua de Cícero; sunt hominaes (há homens)
Fernão Lopes emprega-o assim: son alguns...
Há um contra a invcar: verbo no singular e sujeito no plural,
mas isso nõ obsta É um idiotismo da Língua Portuguesa, Que dizer de: eu parece-me?

Na frase do topo, considera-se errado o número plural do verbo auxiliar " passaram" Até este erro mostra à evidência que o sujeito da oração ´´e, de facto "razões".

O uso da Língua manda afinal que usemos o singular:
passou a haver razões, Assim escrevem os grandes Mestres!

Numa palavra, quando o verbo haver significa existir,
deve usar-se no singular, De igual modo se procede, quando venha acompanhado de um verbo auxiliar, formando ali conjugação perifrástica.
Nisto, como em tudo, cada pessoa come do que gosta. Se alguém não gostar, pois que não coma!

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Lx. Belém
1985-01-26 O maior perigo da nossa Capital


Já falei nisto, por diversas vezes, mas volto à carga, pois amo o público Desejo acautelá-lo. Homem prevenido vale por dois! Quem nos avisa é que bem nos quer!
Em face disto, cá estou de novo, alertando os meus leitores e assim as leitoras, para não serem colhidos em surpresa angustiante! Pode até suceder que não conheçam os factos.
Nem todos me leram! A esses me dirijo, de modo particular.É que eu. de facto, avalio facilmente o que mais tarde viria a suceder, em casos desses. Vir de longe à capital e ser apanhado! Não quero, não,que tal se verifique!

. Antesde mais, vou enumerar outros casos existentes,
afim de que o leitor fique elucidado.
Se a minha prevenção diz respeito aos de fora, para usarem de cautela, não esqueço os habitantes, que, por inocentes, merecem atenção!
Nós que vivemos aqui, também por certo, devemos acautelar-nos. Pois bem.

Há imensos casos, nesta cidade, o que não admira! Capital da nação, meio populoso, formado, já se vê, por inúmeras gentes, de procedências muito variadas, não surpreende ninguém, que haja contratempos e bastas surpresas, harto desagradáveis!. Passemos em revista, os perigoa maiores.

O comboio eléctrico é óptimo recurso, para toda a gente. Sempre disponível. frequente e pronto! Apesar de tudo, requer atenção a passagem de nível.
Quantos e quantos não ficaram por ali! Jamais voltaram! Atenção às palavras: Pare,escute e olhe!.
O mesmoo se passa com o sinal de cor vermelha.

2 . As linhas aéreas são outro obstáculo à paz das gentes.
O aeroporto, aqui junto da cidade, é um grande contratempo! Se cai um avião daqueles volumosos! Que será dos transeuntes?! E sobre um prédio?!
3 . Os auto-carros-laranja que varam a cidade como raio furioso, procedente das alturas, também colhem alguns que vão ensimesmados, atravessando a estrada,sem prestar
atenão
4 . Cauteleiros e Ardinas, sobretudo os primeiros. É conveniente, em lugares frequentados, pôr con antecedência, algodão nos ouvidos, pois os seus gritos e berros descomunais
podem, às vezes, romper, dum jacto, as membranas do tímpano, Muita prudência, quando se abeiram!

5 . Aberturas imprevistas e extravagantes. Olhando alguma vez para as filhas de Eva, é assaz frutuoso desviar a atenção e lançar os olhos noutro sentido.Exíguas saias, ainda rachadas com desaforo, mostram deformidades, que tiram para logo a alegria de viver! Só lucro haverá em sair do local.

6 . Cantos e ângulos, esquinas e obstáculos. Ao passar juntinho, é bom fazer isso já prevenido. Há marcas no chão que desdouram a existência, acusando urinas e certos detritos, Adregando de passar, faça-se a correr, apertando o nariz, com os dedos em tenaz! Se o cheirofor intenso, correr à desfilada!
7 ....Bancos de jardim, Praças e Avenidas, Parques e Alamedas. Sentar-se ali, mas utilizar uns óculos escuros,
pois bem juntinho, há escarros e saliva assim como fragmentos de cascas e papéis.

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Lx. Belém
1985-01-27 Cont.

8 ....Pequenos montículos; pneus de automóvel e troncos de árvores. Impõe-se ali rigoroso cuidado, para não ser vítima de enormes desaires. Ha cheiros deprimentes, urinas e fezes, por que são responsáveis os donos dos cães.

9 ,.... Carteiras e Pastas, Cordões e Relógios.
Ouço tantas queixas, de lágrimas nos olhos, que sinto piedade e grande compaixão! Por isso, aqui lhes deixo o aviso:
não saiam de casa ou então se o fizerem, arrecadem primeiro os objectos de valor.

Saindo à rua, convém fazê-lo, com enorme cuidado! É que, às duas por três, vêem-se roubados. Nada importa, afinal, que seja à luz do dia.

10 .....Fumadores e Fumasdoras.
Como é repelente o cheiro emanado, convém usar máscaras, de modo especial, em horas de ponta, quando todos se aglomeram nos transportes da cidade. Não o fazendo, receio que desmaiem, por ser nauseabundo o que vem dos brôquios e sai pela boca e pelo nariz!

11 x....Prédios já velhos, bastante desconfortáveis.
Disto, agora, nem queria falar, mas há-os por aí, já tão desconfortáveis, e minados pelas chuvas, que temo deveras, pelos transeuntes! Passar... é claro, mas sempre a fugir!

12 .....Paredes e muros bem como relvados.
Também importa, aqui, afastr prontamente os olhos curiosos, pois se lhes deparam urinas e manchas que desdouram e rebaixam o povo deste século. Escritos infamantes, grosseiros e malcriados,... clareiras censuráveis e ervas calcadas! Não demorar!
Não acabaria, levando até ao fim, a lista desonrosa de acções e aspectos que assaz confrangem! Por isso, vamos de seguida, ao perigo maior que voga, na capital,
13 .....Cuspidores e cuspideiras.

Em tempos já, ouvira falar de cuspideiras, répteis perigosos,
que se encontram, em África, mais exactamente, na República de Angola. Tão nocivos e danosos,que, a ser verdade, originam a cegueira. Longe estava eu de pensar, então que, da mesma sorte, cá houvesse cuspidores, sem faltarem cuspideiras! Muito se engana quem cuida! Aprender até morrer!

Ninguém o ignora, pois o facto é notório.
Inúmeras pessoas criaram tal hábito, que o fazem sempre, a torto e a direito. Quero eu dizer: cospem e escarram, em qualquer lugar
e a todas as horas, Interessa defendermo-nos, afim de evitar enormes dissabores,
Sinto vergonha, nojo e asco estando ao pé. Agem eles e elas, com tal desembaraço, arte e dextreza, que ninguém consegue desviar-se a tempo!

Viajei bastante, por Europa e África, mas não verifiquei, em parte algumal, o que vejo aqui!. Sinto-me inseguro, oprimido e frágil, ante o perigo ingente dos cuspidores e escarradores!

Tudo lhes serve! Janelas e portas, regos de água suja, sarjetas
e entulho, qualquer elevação, bordas e passeios, paragem de transportes... Nada os detém! Além disso, fazem-no todos, para a direita e para a esquerda; umas vezes em frente e outras para trás!
Nem escapa igualmente a camada mais alta, pois muitos deles o fazem para o ar!
Que tristeza! Que atraso e javardice! Que falta de senso e, de igual passo, rematada cretinice!

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Lx. Belém
1985-01-28 Fazer uma Tournée; destaque.
Apreciei, desde sempre, matéria literária.Consagrei a minha vida ao estudo das Línguas, de modo especial a que bebi com o leite materno


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..





, cá neste mundo e na eternidade,.,se é que não morreu. Onde, pois, o investimento? Assim, dinheiro e valores vão para fora ou deixam de entrar. 9-2 ??
Quem deve pôr termo a estes males de ordem geral?
O governo socialista, procurando actuar, com toda a energia, decisão e rapidez. De outra maneira, perde a confiança,
habilitando-se já para naufragar.

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Lx. Belém
1985-02-10 As gelosias baixaram.

Quando tal acontece, a noite aproxima-se ou, pelo menos, vai iniciar-se um período tranquílo, em que os ruídos,a luz e as coisas deixam de actuar. Trabalho intelectual? Um assunto delicado e cheio de imprevisto? Uma sexta repousante? Um sono reparador?
Algo neste género se encontra em causa!
Quem está de fora entra em conjecturas e dá-se a pensar! O mundo retira~se, não seja indiscreto, importuno e molesto!

Dois ambientes se gizaram, afastados um do outro, pelos seus objectivos. Realizam-se em pleno, devido às circunstâncias que agora os rodeiam. Dum lado. o movimento, a funda agitação, a
intriga porfiosa, a luta incansável pelo pão e vestuário. Do outro, a calma, o sossego, o marasmo, a quietação

Algumas vezes, a calma é aparente, já que, no interior da própria consciência ou na esfera específica da inteligência, reina grande
agitação. Quantas vezes não sucede haver só aparências?! Não diz o provérbio que as aparências iludem?! Pois! Não há! incerteza de que os factos se avolumam, fornecendo aspectos os mais diversos!
Entretanto, o facto curioso por mim observado, tem cunho, especial, razão estrita pela qual o consigno e lhe faço comentários. Sucedeu nos transportes.

Era num auto-carro, o número 29, que faz o percurso, entre o Barro do Padre Cruz e o terminal de Algés.
Um pai amoroso sustentava nos braços a filhinha adorada, Por ser pequenina e deveras meiguinha, constituía objecto dum culto
rendido
Olhava para ela, demoradamente. Cismava, em seguida, ficando alheado, por tempo indefinido Depois, a qualquer movimento, esboçado ali pela criança, voltava a si, fixando os olhos, em grande alvoroço, como a devassar os penetrais da meúda!
O mundo, em volta, era-lhe indiferente. Conversa ou diálogo, ruído ou canção, nada lhe diziam. O objecto de culto estava em seus braços,procurando entregar-se.lhe, de alma e coração!
A criança, porém, a partir de agora, começa de alhear-se.
Diríamos até que a tomava o cansaço. Relaxada em monvimentos, aparenta um abúlico, um ente sem acção. Apagara-se nos olhos o brilho da luz... os membros descaíam e o sorriso diluíra-se,

As suas pálpebras oscilavam ainda, subindo e descendo, cada vez mais lentas. Parecia uma candeia, prestes a extinguir-se:
tão débil já era o seu bruxolear! E o facto realizou-se. As pálpebras baixaram, ficando imobilizadas, e o pai extremoso, imóvel também, cai desde logo em profundo mutismo.

A criança adormecera ou havia entabulado um diálogo vivo com os mesmos Anjos. Fiquei cismando também, naquela hora adorável, em busca do passado. em que eu era menino, com um pai adorado, igualmentr extremoso..

Assim permanecu, por tempo indefinido, até que, por fim, a cruel realidade me chamou de novo, trazendo consigo a desilusão.

*****
Lx. Belém
1985-02-.11 Uma voz do Passado

Hoje, de manhã, tive uma surpresa. Acontece, geralmente ser desagradável o que surge de improviso. Entretanto, como não há regra sem excepção, de vez em quando, lá nos aparece uma aberta risonha. Esta, anunciada, foi uma delas!

Logo de manhãzinha, ao chegar a Alcântara, diz um colega, o Padre Calado:" Olhe cá! Ouviu Almeida Santos? Ante-ontem, cantou um belo fado, com toda a mestria! Ignorava-lhe a faceta!
Quanta vida ele põe, na sua execução! Pode colocar-se ao lado dos melhores da época presente, como Luís Góis e outros mais!

Quanto a mim, não era novidade, pois o conheço, desde muito jovem, Belos tempos esses de 1943, em que eu, também jovem, o encontrei, na sua terra natal! Nessa data, andava eu só
pelos 25, sendo-me confiada a sua terra de origem, afim de reger a vida espiritual daquela paróquia -- A Vide,

Um grave descolamento, operado na retina, fez-me abandonar a dita freguesia, que era, realmente, a terra dos meus sonhos! Por essa razão, dediquei-me, em seguida, ao ensino das Línguas,Saí de lá, no mês de Fevereiro de 1945, havendo tomado posse, no mês de Setembro de 1943.
Jamais esqueci os bons amigos de então, em cujo número
avultava decerto. a família Almeida Santos. Pois nessa data, era ainda jovem o Ministro de Estado.
Um rapaz de linha, estudante caprichoso e de larga visão, distinguiu-se em breve, pelas altas qualidades que logo o impuseram. Entre elas todas, figurava notória a de belo cantor..
Volvidos anos - já mais de 4o - é deveras grato ressoar nos
ares a voz dum amigo, que me transporta à Vide, no concelho de Seia!
Finalizara o meu Curso, no mês de Julho de 43, descansando três meses, para entrar na arena,logo em seguida. Era, pois, a minha estreia!.Saía, realmente, do círculo fechado, para entrar no mundo e actuar sobre ele! Em tais circunstâncias, era tudo novidade, para os meus olhos, altamente deslumbrados!
Mercê deste facto, recordo saudoso esse tempo breve, em que mal dei conta de quanto me cercava! Apesar de tudo, foi suficiente, para me convencer da beleza moral e dos pergaminhos,de famílias excelentes. É por isso que vibro, ao chegar-me a notícia de factos salientes, que sejam alusivos a tais pessoas.
Eles falam alto ao meu coração. Uma grande parte desses belos corações que deixei, à data, já os ceifou a morte, com mãgoa sentida e funda tristeza a invadir-me o peito. Ficaram, depois, os seus descendentes, em que alinha tgtambém o Doutor Almeida Santos.

Os elogios que lhe são tecidos baixam à minha alma, qual suave perfume, que logo embalsama!
A propósito: quando é que farei uma visita longa àquele bom amigo?! Há tanto já que trago isto no peito! Estudarei o assunto, quando o tempo melhore.

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Lx. Belém
1985-02-12 " Não sei como isto é!"

Foi pela manhã que eu ouvi o dito. Uma senhora, já um tanto idosa, mostrava-se espantada, por causa dum facto, que passou a expor.Difícil eu acho definir o seu estado! Denotava
espanto, surpresa, diria até, um pouco talvez de agastamento! Parecia-lhe um enigma.

Bom! Vamos por meúdos, expondo as circunstâcias e alguns pormenores.A senhora não estava sozinha. Bem junto a si encontrava-se o marido, que ela amparava, com enorme solicitude. Ele, por sua parte, denotava alvoroço, grande agitaçao e enorme cuidado!
Auxiliado por muletas, ia-se arrastando, com enorme dificuldade. Afinal, tivera uma trombose que os deixou assombrados! São lá da província, mas vieram à cidade, com intuito de melhorar. Bom!Até aqui, nada estranho! Todos fazem assim. O caso especial vai agora ter início.
Como interpretar as palavras da esposa?! Eu, que estava presente, fui posto em dia, sobre quanto se passava, o que permite realmente elucidar os leitores. Entretanto, não quero deter-me, em simples amostra! Intento ainda juntar, em seguida, breve comentário.

Este casal vai à sacristia, na igreja de Alcântara, para ser elucidado, acerca de horários e outras coisas. Após serem atendidos, havendo ele regressado ao templo do Senhor, volta ela para trás e dispara-me a frase:"Não sei como isto é!"
Claro! Apenas com isto, não seria capaz de embrenhar-me, a
rigor, no seu pensamento! Entretanto, juntou algo mais que fez luz, sobre o caso!
" Enquanto podia, nunca ele foi à Missa nem queria saber!
Agora que está doente, é que tenho de aturá-lo, para vir à igreja!
Como é isto?!Não percebo!"
Ante a embrulhada que a senhora apresentava e que, de modo nenhum conseguia perceber, apressei-me a fornecer alguns dados preciosos que julguei oportunos.

Disse-lhe eu então mais ou menos o seguinte: " Minha senhora, não sabe o que isso é?! Ignora, por ventura, o significado?! Surpreende-a a mudança?! Pois eu lhe digo: compreendo muito bem o que está sucedendo. É Deus do Céu que vem ao seu encontro, por meio do sofrimento! Trata-se dum favor, que Deus lhe vai fazendo!
Renda graças ao Senhor, por tão grande empenho e aproveitem agora tão bela oportunidade. É, de facto, o Senhor que agora vai passando!
Isto, mais ou menos foi o que eu lhe disse. Ela ouviu e ficou serena! O sofrimento é o sinal de alerta que o Céu utiliza, para
acordar as almas. Mal habituadas, um tanto negligentes ou ainda remissas, caem no olvido ou na tibieza, necessitando um abalo ou
sacudidela, para reflectirem
Que diz Garrete, no Frei Luís de Sousa? "Deus aflige, neste mundo aqueles que ama..."
Também não é outro o sentido exacto dos Livros Santos e inspirados.
O sofrimento opera na alma, ao jeito de cadinho, afim de a purificar, saldando parte da nossa dívida. Serve, antes de mais, de
alerta necessário, chamariz e incentivo; depois, alijeira a carga que permite à alma sair do Purgatório, com menos tempo, em sua detenção
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Lx. Belém
1985-02-13 Uma Carta de longe

Foi há pouco ainda.. De passagem breve, pela Amadora, aonde vou com frequência, achei duas cartas que não eram esperadas: uma da Ção Lopes outra de Mis Swart, na África do Sul, Esta, sobretudo.. encheu-me de aurpresa. na verdade, passaram 6 anos, que visitei os Swarts, nas férias de Páscoa de 1979.

Efectivamente, decorreram as férias, em Aut Bay, nos belos arredores de Cape Town. Uma estadia que foi maravilhosa!
Deleitosos passeios,pelas cercanias, enfim direi: um tempo inesquecível, pela hospedagem que me foi dispensada!!

O Reitor do Liceu, onde eu era professor, Mister Swart,
ofereceu-me a estdia,em casa de seus pais, Recusara, a pincípio,
que não queria ser pesado, entretato, m escê da insistência, não tive remédio senão decidir-me!

Na Base do Rundu, capital do Cavango, tomámos o avião, rumo a Cape Town.. Pertence à Força aéria da África do Sul. Um
voo excelente! Para mais, gratuito!
Chegados a Aut Bay, receberam-nos com júbilo os pais do Reitor, que a todos acolheram,com fina amabilidade. Fiquei emocionado!
Bom. O tempo rodou e, no fim desse ano, deixei par sempre a ´daquela República, para vir a Porugal Até paguei ida e volta!

Entretanto, resolvi não voltar. Fá-lo-ia decerto, se fosse mais novo. Estava, nessa altura, com 60 anos. Instalei-me em Lisboa e cá tenho vivido. Apesar de tudo, jamais esqueci os meus bons amigos.
Pelo Natal, enviava sempre um cartão de B.F.
Ignoro, realmente, se os têm recebido. O deste ano, porém, tenho a certeza de que foi entregue. A confirmá-lo, aqui tenho uma carta, procedente de Stanford, um lugar já diferente do que eu esperava.
Alguma coisa, por certo, havia ocorrido. Nem tudo são
rosas, mas a vida é assim!.O marido da senhora faleceu há 10 meses. Um grave colapso do coração pô-lo na outra vida!

Tive imensa pena, que era, na verdade, um senhor muito bom e um amigo simpático. A senhora Swart, embora com atraso,
devido certamente à mudança de lugar, escreveu-me, em resposta, uma carta enormíssima: nada menos, por certo, de 4 páginas!

Até me dá conta do que tem ocorrido, ao longo destes anos!
De tudo gostei, mas sobretud, falo sincero, do Doutor Swart, que foi um bom amigo, como se fora irmão! Deixou também o
Sudoeste Africano, onde fora Reitor, leccionando agora, em East Cape, Refere-se também à esposa do filho, Mary Rieckie e ``as três meninas, duas das quais eu já conhecia: Rosita e Ónica..

A mais novinha tem 4 anos. e chama-se Nadie.Vou pedir o endereç, para escrever ao pai. Muito mais coisas apresenta ainda. Tem 11 netos e acha-se velha. A filha mais nova, Suntie, está ainda com ela. Manifestou regozijo, por eu os ter lembrado e pede
postais que uma neta aprecia, pois se dedica realmente, a fazer colecções.
Logo que possa, já respondo à carta.

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Lx. Belém
1985-02-14 Recuava sempre.

Recuar, por via de regra, é sinal de temor. Há, por vezes, recuos estratégicos ou até simulados. Não teriam conto as imensas variedades, neste capítulo. Entretanto, o assunto que me prende, não é este, decerto. Antes, porém, de entrar na questão, vou
fazer referência a processos usuais, que nos tocam de perrto, em matéria de recuos.

Fim utilitário ocorre nos transportes, o que é usual e sucede, a toda a hora; objectivos militares, com fim determinado, estratégico e útil, embora por vezes, signifique receio; finalidade rítmica, em danças e bailados.

Entretanto, o caso observado, há poucos dias, num carro laranja, é mais curioso do que nós juulgamos! Isto, a rigor, mercê das circunstâncias, verificadas lá dentro.

Em regra, há muita gente e poucas viaturas. Resultado? Entram ali muitos mais do que devem, ficando em pé a maior parte da gente. Por vezes, não se encontra um palmo que esteja sem ninguém! Mal haja o diabo! Quando tal acontece, originam-se dramas.
As pessoas idosas já não suportam esses balanços tremendos, que sáo dolorosos e muito frequentes.
Quem está sentado não olha à volta nem lhe interessa oferecer o lugar a um pobre velhinho ou pessoa doente!

Há, é certo, lugares reservados, para tais pessoas e outras mais. Contudo, nem mesmo esses estão disponíveis! Em tais casos, que há-de fazer-se?! Aguentar, sim, e cara alegre!! Salve-se
quem puder!
Já lá vai o tempo, em que a gentileza era soberana, a governar o mundo! Hoje, não! Perante o sucedido, nada a esperar!
Bom. O que importa, dados estes casos, é ter paciência, agardando assim, tempos melhores.
Como sardinhas, empilhadas na canastra, aí vão esses homens e, às vezes, mulheres, sem poderem sequer respirar à-vontade!
Ora, sucedeu há tempos achar-se à minha frente certo cavalheiro, que me fez cismar! É que ele, de facto, recuava sempre! Isto irritava-me, porque eu, impelido, ia-me arrastando,
no mesmo sentido, na mira de evitá-lo.

Bem eu insistia, mas sem utilidade! Figurava acinte!
Comprimido em extremo, nem podia respirar! Estive resolvido a empurrar o tipo. Nem eu sei agora por que é que o não fiz! Coisa aflitiva! Cheguei aujulgá-lo já feito em arco, aproximadamente, dando a nuca dele na mimha pobre testa!

Claro! Achava-me intrigado! Que haveria ali, para ele se manter?! Onde há fumo tem de haver fogo! Temor de ser pisado? Receio de apertos? Procurar ali uma posição que fosse mais cómoda?

Até podia ser! Apesar de tudo, nada eu vi que fosse adivnhado! O que fazia mexê-lo era um cigarro que mantinha na boca. Longo e encorpado estava-se ajeitando, para ser queimado.

Sendo proibido fazê-lo já, no interior do carro, aguardava a saída, para deleitar-se. Vieram-me ganas de abanar o sujeito! Por causa dum cigarro. todo o mundo a sofrer!

O leitor percebeu? Mantendo-o na boca, evitava o sujeito que alguém lhe tocasse!
Entretanto, com os solavancos e mudanças de lugar, paragens inesperadas e o mais ainda, usava de cautela, não fosse prejudicado
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Lx. Belém
1985-02-15 "Perdoai.nos, Senhor, as nossas dívidas"
Era assim, na verdade, que dizíamos há anos. Entretanto, as palavras mudaram. embora o sentido permaneça
igual. Imagina o vulgo ser coisa diferente, mas o certo e sabido é não ter razão.
Do Latim "debita nostra" veio a tradução " as nossas dívidas" Assim usou dizer-se, ao longo dos séculos e todos compreendiam o sentido genuíno que as palavras encerravam.

Já no século XX, o termo"dívidas" foi substituído pela palavra "ofensas". Factos destes ocorrem , na verdade, em qualquer idioma. Enquanto uma Língua é falada ainda,(Língua viva) está sujeita a metaplasmos, quer dizer, alterações, no campo da Fonética.
Por vezes, certas palavras perdem seu uso (arcaísmos): ca. nanja,etc., sendo substituídas por outras diferentes. Outras vezes não caem, mas deixam de usar-se, em dada acepção, É o caso de "dívidas"
Em tempos idos, utilizava-se 'dívida', em sentido moral. Assim eram designados os pecados cometidos. Não estava mal, porque as infracções à Lei do Senhor têm de ser reparadas. O Céu que e justo requer satisfação, como paga genuína ou compensação
A criatura ousa ofender a mesma Divindade? É obrigada a pagar esse grande atrevimento e falta de respeito ao seu Benfeitor. Deus é tudo; a criatura é nada! Quanto possui, incluindo a vida, pertence a Deus!.Por estas razões, pecados e ofensas constituem dívidas.

Quem transgrediu fica obrigado a fazer reparações. Portanto, dívida é aquilo que é devido a outra pessoa.No caso presente, ao Senhor de tudo. Eram, pois, equiparadas: ofensas a Deus e débitos monetários ou quaisquer bens materiais.

Em nosso tempo, decidiu-se pôr fim à palavra 'dívidas', restringindo-lhe o sentido. Ficou, portanto, a designar o dinheiro, que se pede emprestado ou alguém não pagou, na compra dum objecto, Veio isto a pêlo, não há muitos dias.

Encontrando-me na igreja, ouvi então rezar daquela maneira à gente da província. Fiquei admirado, pois há muito ja, que o termo se não usa, nesta acepção. Registando o facto, quis deixá-lo aqui e tecer a propósito, alguns considerandos.

Toda a gente, creio eu, procura actualizar-se. Uns fazem isso espontaneamente; outros são obrigados.Hajam vista a propósito, os Cursos de Recilagem.
Por que não há-de ser o mesmo nas coisas religiosas, com vista directa à uniformidade?!.
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Lx. Belém
1985-02-16
" Não deitem ciinza na minha avozinha!"

Ocorreu a cena, ainda há poucos dias, num cemitério da nossa caopital. Não foi caso relatado, pois estive presente,
razão pela qual vou narrar o facto, segundo o observei.

Era por uma tarde bastante chuvosa, no mês de Fevereiro.
Sobre o rectângulo, apoiado ali, em 4 pés, encontrava-se um cadáver, já muito prestes a ser fechado e metido no coval

Em redor, pessoas chorosas, com ar de aflição, enquanto outras se achavam consternadas.Momentos angustiosos! Vai fazer-se para sempre ( cá na Terra!)a última despedida,
o que torna o caso algo patético! É assim a vida!

Acabadas que foram as sacras orações, o agenta funerário
abre o caixão, enquanto o empregado, empunhando um balde, cheio de cal, se encaminha ligeiro, para junto do cadáver-

Presenciando a atitude, irrompe do grupo uma adolescente,
implorando com lágrimas e ar determinado: " Não deitem cinza minha avozinha!" Estas palavras brotavam da alma, com viva eloquência e eram repetidas, vezes sem conta!

Entretanto, veificand ali que não era atendida, investe resoluta, por entre os circunstantes, dando mostras de opor-se ao acto esboçado. Neste passo, alguém a segura, para que ela se detenha. Vendo frustrados seus altos desejos, grita com força e lágrimas quentes:" Não deitem cinza na minha avozinha!"

Ante o espectáculo da criança em lágrimas, chorando sufocada, impotente e mesquinha, todos se comovem! Também eu não fui estranho! Jamais oresenciara uma cena do género!

Apontaram-me as lágrimas! Não fui superior!
Os gritos lancinantes da parte final, atirados ao ar, em vivo desespero, caíram na minha alma que ficou prostrada! Eram vozes tão puras, sinceras e leais! Eram gritos tão fundos, sentidos e chocantes!
Meu Deus! Ter´onze anos, o máximo doze! E já sofre deste modo uma criança inocente?! É isto a vida? Dará gosto vivê-la?!
Se não houvesse Deus nem eternidade!...Se a gente não tivesse um Pai indulgente, amigo e solícito! Efectivamente, Ele morreu por nós e quer o nosso bem. Se Ele não exiatisse, ia ser horrível, infernal... impossível!

Assim, confiamos nesse Pai, afim de compensar-nos de todos os males, num mundo melhor, além da morte!

Jamais olvidarei o facto chocante!
Aos olhos da pequena, ignorante do fim, a que era destinado o que tanto a afligia, tratava-se de afronta à querida avozinha, que ela tanto amava!
Por isso, queria inpedi-lo. Figurava ela que lhe detavam no rosto a 'cinza' molesta! Desconhacia, pois, destinar-se ao ventre aquele produto, afim de consumir, no tempo legal, as
visceras do corpo.
Simpática menina, confia em Deus, que permitirá tu vás encontrá-la numa Pátria mais bela e um mundo melhor!
Lá verás, decerto, um corpo glorioso, cheiinho de vida, luz e
encanto, a sorrir para ti.
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Lx. Belém
1985-02-17 Domingo Gordo

Entre as ironias deste pobre mundo, aponto mais uma que hoje verifiquei. Mas. então, porquê?! Ao menos, que eu o tenha sentido, ao longo da vida! A rigor, não parece diferente, em ordem aos outros! Todos iguais! Todos bem magros! O de hoje , então, está sendo magríssimo!

Gordo porquê?! Suponho, de momento, que é por abastança.
Quem tem recursos atira-se, neste dia, a manjares suculentos. Vitela? Porco? Cada um é que pode esclarecer.
Haverá, certamente, grande variedade e enorme abundância.

Porquê? Adivinhar não é permitido, mas tenho palpites.Mercè
da Quaresma, que já se aproxima. Será isto, de facto, razão suficiente? Como desforra, pelas restrições que impõe a quadra?!
Não me parece que seja razão! Os rigores de outrora já não existem. A Quaresma, a pão e água, isso sim, era penitência, mas hoje, afinal, está muito aliviada!

A própria igreja assinm dispôs, devido, com certeza, às carências do tempo, à fadiga excessiva e à fraqueza dos organismos Se bem
atendermos, a abstinência de carne abrange somente as sextas-feiras. Quanto ao jejum, estende-se apenas à quarta-feira de Cinzas e á sexta-feira Santa

Prestemos ainda alguma atenção aos seguintes pormenores: o jejum começa a obrigar aos 21 anos e termina logo aos 58. Por
outro lado, mercê da escassez e falta de meios que agora é geral,
ao manos entre nós, o regime alimentar, na maioria dos casos, não
ultrapassa o do próprio jejum.
De facto, nesses dias, é permitida uma boa refeição´que não tem restrições de espécie alguma, quanto ao volune; além disso, meia refeição, à hora do jantar; ao pequeno almoço, um pãozinho com leite ou outro produto, diluído em água Os líquidos não contam.
Como vemos, há portanto várias atenuantes. Além disso,
pessoas doentes, de físico débil, ou dedicadas a tarefas árduas, estão dispensadas-
No entanto, a que propósito veio este grande arrazoado?
É que hoje foi para mim um dia especial, inteiramente ao invés do que o nome sugere! Com efeito, são já 15 horas e nada comi! Nem pequeno almoço nem o próprio almoço! Jejum total!

A minha noite correu bastante mal. Dor de cabeça e chuvadas contínuas, embatendo com força, na vidraça e no telhado, impediram que dormisse.De manhã, é claro, nem apetite nem aptidão para o meu trabalho!
Lá fui para Alcântara, mas arrastado! Todo o corpo me doía!

Juntamente, as contrariedades vieram completar o quadro lastimoso! A Regina e o Quim foram convidar-me a ir para a mesa, o que eu recusei, para que evitasse fazer má figura.

Estou a ser pesado, no local onde vivo! Reconheço-o há tempo, mas ultimamente é já bem pior!A grave doença de meu cunhado exige de mimha irmã esforço descomunal, o que muito penaiza e afecta grandemente.
Estando lá eu, avoluma-se o caso, É preciso decidir, pois ela não aguenta! Demandar uma pensão? Ficar na Amadora, já para valer? É, de momento, o que hei-de examinar, afim de concluir acertadamente
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Lx. Belém
1985-02-18
Chego, nesta hora, da paragem do eléctrico. Cortando ``a direita, subia lentamente a Rua do Embaixador,com rumo directo à Capela das Dores. É este, na verdade, o itinerário, quando venho de Alcântara. uma vez que me apeio não longe do Museu.
Nisto, em sentido inverso, passa por mim um senhor indignado, que me chama a atenção. Abeirando-se um pouco, toca-me no ombro e diz em revolta:" Olhe, meu amigo, o que está sucedendo, além acima! Havia ali um buraco, ao centro da rua, e vieram reparar o que era danoso,. Até aqui. tudo está bem. O que eu reprovo é o que estamos vendo e se torna escandaloso

Quatro pessoas a observar e apenas uma a trabalhar! Como é que uma nação pode progredir?!"
Aderi, convencido e segui o meu caminho, reflectindo no caso. Tinha razão aquele indivíduo. Será tudo assim, cá no País?!
A nossa economia encontra-se de rastos, Será por isso? Estou em
crê-lo!
A causa do mal não está somente naqueles que governam, embora tal se diga, com muita ênfase! Que faz um Governo com
súbditos moles, harto indolentes, preguiçosos e trafulhas?! Alguns trabalham, outros nada fazem, ganhando a mesma coisa!
Por este andar, quem faz algum trabalho fica descontrolado e deixa-se arrastar pelo exemplo alheio. Quer dizer: aplicando a teoria, chega-se a um ponto em que ningém trabalha. Resultado?

Vai estando à vista! Escassez de dinheiro, por não ter poder de compra; falta de trabalho; grande inflação; assaltos a Bancos e pessoas privadas; rapinas escandalosas; corrupção e miséria.!
É o que estamos observando, por todo lugar, dentro do País!
Que mais veremos ainda, na Pátria mísera, por falta de um homem?!
Temos o Socialismo a fazer experiência, mas com pena minha, ao menos entre nós, como ele vai agindo, não colhe os frutos que todos esperávamos. É um sistema bom, para outras sociedades. A nossa, porém, deve ser vigiada! Importa exigir-lhe.
Tem de haver repressão.

A teoria geral do Socialismo há-de assentar num ponto de vista que se baseie no temperamento, circunstâncias peculiares e
civismo dum povo!
De modo nenhum se pode aplicar o figurino de longe, sem mais
nem para quê!.Precisa retoques, adaptações, lei contrastante que exija alguma coisa de ladrões e assaltantes, violadores e drogados,
numa palavra, que ponha ordem em tudo e chame, desde logo à responsabilidade os infractores da lei portuguesa. como também os perturbadores do sossego e da paz

A santa liberdade é para todos: não somentepara grupos em que entrem malfeitores, assassinos e ladrões!

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Lx. Belém
1985-02-19
Rua do Embaixador
Capela das Dores
Belém
13oo Lisboa
Bom Pai do Céu:

A volta 67 dá hoje o seu fim.
Venho, por esta razão, escrever uma cartinha, afim de expressar,ante Vós e o mundo, quais os sentimentos que vivo nesta hora. Nunca o fiz, no passado mas, desta vez, ocorreu-me a a lembrança, motivo assaz grato, por que levo a cabo tão grande
aspiração, A 19 de Fevereiro de 1918, nascia, em Vide-Entre- Vinhas, a criança desejada, o prineiro rapaz, que relata agora o acontecinento.
Quisestes Vós, Senhor, que eu fosse criatura , doando-me faculdades que me enchem de orgulho: inteligência, vontade e
memória. Estas, na verdade, colocam-me acima de toda a criação,
que se move e agita, neste planeta.

Elevastes-me, pois, acima dos minerais; foiVosso desejo ultrapassasse muito os próprios vegetais; não quisestes, além disso, que eu fosse olhado como simples animal! Sinto-me grato e cheio de amor, pela nobre distinção!

Não sei, a rigor. como hei-de exteriorizar tão viva alegria!
Tivesse eu palavras, mas neste mundo, é de todo impossível exprimir o que sinto, em questão de amor, reconhecimento e
adoração! Quem pudesse louvar-Vos condignamente e render as
graças a que tendes direito!

Mas sou tão pobre, ao querer voar, pelas alturas que Vós habitais! Um dia será, por Vossa misericórdia!

O meu ser, porém, é constituído por dois elementos: corpo e alma.É meu desejo referir-me também ao corpo maravilhoso que
Vós me formastes. Se calculo, de algum modo, o valor material do meu organismo, fico pasmado, com a perfeição, ordem e valia!

Basta, na verdade. olhar ao custo dum coração, feito pelos homens: dois mil contos!
Quanto dei pelo meu? Absolutamente nada! Fostes Vós, Senhor, quem mo ofertou! Nada eu merecia, para que Vós assim fizesseis! Diz-se e repisa-se, habitualmente, que o físico do homem é dado pelos pais, enquanto a alma, por ser imaterial e
espiritual, é criada por Deus, em cada ser humano.

Quanto à primeira parte, não estou de acordo! Os pais, na verdade, são meros instrumentos que Deus utiliza, para transmitirem o que lhes confiou. É que a vida é dom inefável do Céu criador!
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Lx. Belém
1985-02-20 Cont.
Quero, neste dia, que tudo, em mim, fique bem claro! Como eu o sinto, desejo exará-lo, no presente Diário.
Vós, Senhor, depositastes nos pais a centelha de vida, tão maravilhosa, que brota do Vosso íntimo. Sem Vos, não há vida.
Apenas marasmo, podridão e morte!

Cada um dos órgãos que me formam o corpo é dádiva celeste, porque nem os meus pais nem os sábios da Terra jamais
serão capazes de fazer tais órgãos, animados de vida! E nada paguei, Senhor meu Deus, por este benefício, de valor incalculável!
Além disso, ficaram todos eles a funcionar em pleno, pois se
encontram, a rigor, no lugar que lhes marcastes! Deixo já o coração, este motor poderoso que, situado ao meio, impele o sangue em todos os sentidos, para transportar o nosso ali mento bem como o oxigénio às células do corpo e trazera aos pulmões o enorme desgaste da combustão e outros empregos.

Lembrar-me eu agora que o meu coração, aos 18 dias, começou a funcionar! Há tantos anos, sem parar um momento!
Como sois belo, Senhor meu Deus! Como é grande o Vosso poder! Que enorme bondade, para com os seres1
Daqui, faço já carass aos dois rins. Até o lugar me fala de Vós! Perto da bexiga, para ali depositar os produtos nocivos!

Em número de dois? Porquê? Por que não apenas um?
Foi cá na Terra que o plano se gizou?!
O número em causa é devido, certamente, â grande importância e forte necessidade que o organismo tem deles. Falhando acaso um, ainda fica o outro!

Há-de haver 15 anos, falaram dum caso que fez vibrar o país. tratava-se de alguém, com os rins afectados. Ficando inoperáveis, era necessário intervir, semanalmente, com tal dispêndio , que se tornava insuportável, financeiramente.
Já então, se a memória não falha, custava 12 contos! Quarenta e oito, por mês!

No entanto, eu nada paguei, para que Vós mos désseis! Por
outro lado, funcionaram sempre, de maneira inalterável! Quanto eu Vos devo, Senhor meu Deus!
Agora o fígado!
Que órgão excelente! Além de conribuir para a digestão dos nossos alimentos, fazendo o quimo passar a quilo,( substância leitosa, assimilável pelas células)), é o grande 'regente' da orquestra orgânica. Dizem os peritos que desempenha tal órgão funções variadas, cujo número pasmoso excede 30!
E eu nada paguei por tal doação! Há 67 anos, funcionando sem erro nem folga nenhuma!
Que direi, então, acerca dos pulmões?!

Em número de dois, feitos ambos de matéria esponjosa, o que proporciona grande capacidade, é neles, realmente, que o sangue se purifica, já que por meio deles o óxido de carbono é lançado no exterior.
À maneira dum fole, regula, com esmero, as entradas e saídas do ar, imprescindível,
No entanto, eu nada gastei nem sequer houve cuidados, acerca do assunto!
Achei-me dotado e encontrei-os logo em plena execução!

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Lx. Belém
1985-02-21 Cont,
Seria longo o tempo, quase interminável, se quisesse esmiuçar! Tantos são os órgãos e tão diversas as suas funções!
Que aparelhos excelentes! Que sistemas curiosos e cheios de maravilha!
Começo, desde já, pelo digestivo. é constituído pelos se guintes órgãos: boca, faringe e esófago; estômago com glândulas; intestino delgado e e intestino grosso. Cada un deles encontra-se, a rigor, no lugar requerido, sem alteração nem qualquer desvio.

Quem fez tudo isto, imprimindo tal ordem?
Não fui eu, porque não existia nem foi meu pai, porque não sabia:
era quase analfabeto! Ignorava, por inteiro, a coordenação e o funcionamento. A quem hei-de agradecer?

Vejamos ainda: logo na boca, os dentes e a língua, e as glândulas salivares. Por que estão ali as glândulas e o mais que resta, e não em outro sítio? De facto, era lá precisamente que se
tornavam precisos. Com efeito, ali começa a nossa digestão. formando-se o que chamam 'bolo alimentar.

Para que isto se reslize, intervêm os dentes, o suco salivar e a própria língua. Depois, o bolo referido cai no estômago, onde é continuada a função digestiva. As pregas membranosas deste recipiente bem como o suco gástrico actuam fortemente sobre os
alimentos, para os transformar em uma substância, designada por 'quimo'.
Do estômago, através do piloro, passa o alimento. para o duodeno e, seguidamente, ao intetino delgado, onde sofre, de novo, transformações, por meio do suco entérico e da bílis ou fel.
segregado na vesícula, alojada no fígado.. Termina aqui a fução digestiva.
Está formado o 'quilo', alimento assimilável pelas células do corpo.
Do intestino delgado, retira o sangue a substância leitosa que transporta para as células, onde vão realizar-se as chamadas combustões. Destas, pois, resultará o calor e a energia necessária,
para nós trabalharmos
Tais combustões tornam-se possíveis, por neio do oxigénio que o sangue arterial recebe dos pulmões, levando-o seguidamente, a todas as partes do corpo humano.

Terminou a digestão, mas o intestino delgado continua por um tubo qie é muito mais grosso, onde são aumulados todos os resíduos e produtos nocivos para o nosso organismo. São as chamadas fezes!
Como tudo é belo e surpreendente! Além disso, tudo gratuito!
Como não louvar ao Senhor meu Deus?! Adorar e amá-lO com toda a alma?! Querer-lhe até à loucura?! Nada paguei e tudo me doou! Que belos preentes! Não acabaria, descrevendo o agir de qualquer aparelho. É que falta ainda o circulatório, que vem completar o digestivo.

O sangue humano, formado, como é sabido, por um líquido espesso, glóbulos vermelhos e glóbulos brancos e plaquetas sanguíneas é o veículo certo, para levar às células o oxigénio e também o quilo, trazendo, em seguida, no regresso aos pulmões, as matérias nocivas.

Memcionarei também o nosso aparelho, dito respiratório., qie permite a entrada e saída do ar, sem o qual não é possível a combustão das células. Entram nele os seguintes órgãos:
boca, faringe e laringe; traqueia e brônquios; bronquílios e pulmões,
No seu movimento, através do corpo, circula por veias e por artérias e vasos capilares. Os glóbulos vermelhos levam consigo hemoglobina ; os glóbulos brancos defendem o organismo. São os soldados que guardam e protegem o nosso corpo.
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Lx. Belém
1985-02-22 Cont.
Siga para já, uma breve referência ao apafrelho que
chamamos urinário. É formado pelos rins, bexiga e uretra.
Sem ele presente, morríamos todos, por intoxicação
Qianto a sistemas, quero mencionar o sistema nervoso, que
desempenha um papel deveras relevante, na vida humana; o sistema ósseo que serve de base, para apoiar os órgãos e assegurar também o seu funcionamento.

Pelos nervos é que são transmitidas sensações e ordens a todas as partes do corpo humano. Não quero também deixar de
aludirr aos órgãos genitais e à grande maravilha do cérebro humano. Com o primeiro transmite-se a vida a seres da espécie,
realizando-se a ordem que o Grande Arquitecto deu , no Paraíso
terreal, ao primeiro par: " Crescei e multiplicai-vos!"

O óvulo humano, pequenina célula, formada no ovário, é
matéria viva, parada e passiva. Para dinamizá-la e fazer que ela
entre em plena actividade, é necessária a centelha de vida, elemento masculino, que lhe dá em profusão quanto é preciso
para o óvulo agir e dar princípio ao nosso embrião , o (ovo).

Este, mercê de Deus, por lenta evolução, deveras maravilhosa, origina o ser humano, desdobrando-se em células, órgãos e aparelhos , sem faltarem os sistemas.
O homem é, pois, o transmissor da vida que depois se aloja
no útero feminino, onde psssa em gestação os primeiros nove meses.
Tudo isto Deus pesou, calculou devidamente, ofereceu e conserva. Pelo que me toca, nada paguei, que nem sequer existia" Entretanto, Deus pensou em mim, organizou o meu corpo e fê-lo actuar. Como Ele é bom, amável e grande!

Quanto Vos devo, Senhor meu Deus!
Se os órgãos genitais são, efectivamente, grande prodígio e alta maravilha, que direi eu do cérebro humano?! Para este, como para aquele, não tenho palavras que xprimam, devidamente, a grande altura e profumdidade que eles ambos encerram!

Valor material do cérebro humano.
Cada neurão, dizem os sábios, equivale, a rigor, a um computador, sofisticado em extremo. Ora, é sabido e provado que
temos, no cérebro, para lá de cem milhões desses elementos.
Tão complicada é a sua técmica, que os próprios cientistas entram em pasmo, sem atingir, por modo cabal, o seu funcionamento e a própria estrutura, em relação com o exterior.
Mais de 100.000000, em cada cérebro! Que maravilha! Que
grande riqueza!
No meu crânio, esfera resistente, protectora e sólida, é que ele, na verdade, se encontra alojado. Também ali se acha o bolbo raquidiano e o cerebelo. É a central, donde emanam as ordens, para todo o organismo, incluindo, pois, os órgãos dos sentidos.

O esqueleto suporta os órgãos e permite, desde logo, o seu funcionamento. como já disse. Os ossos que o formam são duros e elásticos, para se flectirem, mas sem partir. Fazem parte dele os órgãos locomotores, sem a presença dos quais não era possível ir dum lugar para outro.
As ordend emanadas partem do cérebro e, nalguns casos, da medula espinal.
Tudo isto recebi e tenho utilizado, ao longo da vida, com 67 anos ( e agora com 90, ao passar os textos a computador e corrigir as deficiências!)
Nada paguei nem agradeci, devidamente, ao Senhor meu Deus!
Faço-o agora, bom Pai do Céu!
NOTA
Um cientista inglês deixou-nos um cálculo, acerca da maravilha que é o cérebro humano. Dá-me prazer registá-lo aqui.
Se alguém tentasse fazer um cérebro com funções iguais, teria um volume vinte milhões de vezes maior que o nosso.
Quanto à energia, para funcionar, iria subir a dez milhóes de vezes maior que a do nosso
Não existe Deus?! Então quem fez isto?!

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Lx. Belém
1985-02-23
Não quero preterir os órgãos dos sentidos, através dos quais me ponho em contacto com o mundo exterior: olhos e ouvidos, nariz e boca e toda a superficie do corpo humano. Vêm a
propósito os acto realizados por cada um deles: visão e audição; olfacção e gustação; e também o tacto.

Venha, desde já, em primeiro lugar, o mais perfeito e o mais necessário. Que maravilha! Poder apreciar a beleza do Universo, distinguir as cores. fixar também o rosicler da aurora! Deliciar-me a capricho, na suave melancolia dum pôr de Sol!

Ver ainda meu pai; olhar embevecido para minha mãe! Ler nos seus olhos o grande segredo que me traz embalado! Contemplar também o matiz da paisagem... maravilhar-me com os altos relevos!
A máquina fotográfica foi imitada, olhando, já sevê, para o globo ocular. O homem nada cria!Apenas faz, servindo-se da matéria que Deus criou!

Atrás do globo ocular, há três membranas: a esclerótica , a coroideia e a retina. Nesta, exactamente, é que se formam as imagens dos objectos. À frente, vê-se a íris (pupila) que é uma abertura de cor feiticeira, através da qual penetra a luz no interior.

Existe ainda o cristalino, lente primorosa que se acomoda, automaticamente, às variadas circunstâncias; o humor vítrio e o humor aquoso.
O descolamento, operado na retina, produz a cegueira. Pode
provocá-lo uma hemorragia, um salto inesperado ou qualquer movimento, bastante sacudido!

É de surpreender o lugar dos olhos! Tão acomodado não podia haver! A situação permite observar, em todos os sentidos
ou quase todos; mantém-nos de atalaia; acautela-os de avarias, incidentes e choques. O nervo óptico liga os olhos ao cérebro.

Senhor, bem hajas tu, pelos olhos que me deste!
Cabe agora também a vez à audição que tem assento em nossos ouvidos. Preside a ela uma técnica perfeita, harto sofisticada, embora inferior à dos nossos olhos que, através do nervo óptico se
põem em contacto com o cérebro.
O nosso ouvido foi elaborado com três partes distintas: ouvido externo ( pavilhão e orelha e membrana do tímpano; ouvido intermédio, com a janela redonda e a janela oval; ouvido interno, com vários ossículos, entre os quais o martelo, a bigorna e o caracol.
A ligação cérebro é feita, claro está. pelo nervo auditivo.
A olfacção reside no nariz, Quanto nos empolga o aroma duma flor! Quanto nos deleita a suave emanação dum bom cozinhado!

A gustação tem a sede na língua, residindo ela nas papilas gustativas, Como é saboroso apreciar, lentamente, um prato dos nossos! Comprazer-se à-vontade, num bolo de aniversário!

Pois do tacto que está espalhado, por toda a pele, mas sobre
tudo nas polpas dos dedos, que vou eu dizer?! Não causa sensação
a deleitosa maciez e a delicadeza de certos objectos?!
Que dizer então dum beijo de mãe?!

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Lx. Belém
1985-02-24 Cont.
As potências da Alma.

Nesta curta exposição, em que faço referência, embora ao de leve, a grandes benefícios que Vós, Senhor, me concedestes, ainda antes de eu pensar e conhecer o seu próprio valor, quero agora rematar, com breve alusão, às nobres potências que me distinguem de qualquer animal.

São elas, na vedade, que excavam a fronteira entre a animalidade e o ser racional. Estou fazendo isto, para que Vós, ó
meu Deus e adorável Pai, fiqueis agora a saber que não sou indiferente aos Vossos benefícios!

Reconheço-os a todos, sei que os não mereço e sinto confusão, ao pensar nestas coisas. Como é queVós, tão excelente, grandioso e belo.Vos dignais olhar para a minha nulidade e baixa condição?!
É uma fineza que até me descontrola!
Fazei, Senhor, que Vos conheça melhor, para que eu, em seguida, melhor Vos possa amar!
Voltando à questão que levantei, no princípio, encontro-me agora em frente da inteligência."Façamos o homem à nossa imagem e semelhança".
Acho-me tanto acima de toda a criação! Só os Anjos me ultrapassam, mas esses espíritos não vivem connosco, ao menos visivel e globalmente. Habitam outro mundo e só dali vêm,em commissões específicas.
Pela inteligência, posso calcular, fazer os meus projectos,
tirar ilações, distinguir a verdade, amaldiçoar o próprio erro, identificar o belo e amável, assim como o bem; posso ainda compreender, aumentar por igual, o conhecimemto; entender as razões que presidem ao Mundo; fazer estudos científicos, estudar o que me cerca, aprofundar-lhe os motivos.

Que faculdade excelente! Que tesouro inestimável! Haverá aí dinheiro que possa comprá-la?!
Quando a nossa razão se debruça inteiramente sobre os actos passados, avaliando, a rigor, a moralidade e a conformidade com a recta razão - o que chamamos consciência - exercemos uma acção que nos habilita para as Moradas Eternas: é a voz de Deus, cá dentro de nós!.
Que riqueza inexprimível! Senhor meu Deus! Que tesouro, sem igual,Vós me concedestes! Assim, não me engano, pise embora trilho duro, neste mundo venal!

Que direi da vontade? É nesta faculdade que reside o amor!
Ali se gera como alimenta o nobre sentimento que a todos nos une, congraça e harmoniza! Por meio da vontade, amamos ao Senhor, à Virgem Maria, ao Anjo da Guarda, aos Anjos e Santos que habitam no Céu
Cá na Terra, faz o amor de igual maneira, as delícias do homem.
Foi pela vontade que amei os meus pais, irmãos e outros.
Se tudo gira à volta do amor, é à vontade que eu devo, realmente,
o que torna bela a minha existência, cá neste mundo e vai fazer-me ditoso, depois, lá no outro.
Quanto à memória, que posso eu dizer?
É ela, na verdade, que torna presente quanto eu preciso e é já passado! Sem ela estava, de facto, sempre a começar, ficando a vida sem articulação. Por meio da memória revivo eu tudo o que é grande, e excelente, eternizando a própria beleza. o amor e o bem.
Desculpa-me, Senhor. a grande maçada ! Sou importuno, mas quero amar-Vos! Adeus, até breve. Que o encontro perene seja um dia no Céu!
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Lx. Belém
1985-02-25 Natalidade na China

Toda a gente sabe que o índice demográfico, neste povo do Oriente é, de longe, o maior do Mundo. Em razão disso, vários problemas têm surgido. quando não temores, pelo mundo além.
De facto, bastaria a multidão lançar~se un dia para Ocidente, de braços pendidos, para geral horror, entre os povos da Terra. Dizem por aí que já excede o bilião! Seria uma catástrofe, ainda sem armas!
Bom. Deixemos, por agora, tão feias conjecturas, para ventilarmos, durante momentos, certas medidas, verificadas, na China.
Diversos meios se têm usado, com a mira certeira de afrouxar o crescendo, na questão dos nascimentos. Vários governos, ao longo dos séculos, encararam o problema, de maneira frontal, recorrendo a meios, contrários à Moral isto é,
ao Evangelho. Ninguém desconhece o caso da China.

Afim de sustar a cifra de nascimentos, aconselha o governo a todos os jovens, que não tenham pressa de chegar ao matrimónio.
Escolham, sim, parceiros agradáveis e deveras simpáticos,
estabelecendo contactos frequentes e dando passeios.

Isto, realmente, foi o que disse a Imprensa e eu pude reregistar. Outros governos recorrem prestesmente à esterilidade.
É o caso de perguntar: quem lhes deu permissão, para assim transgredirem a Lei do Sehor?! " Crescei e multiplicai-vos."
Foi esta, na verdade, a ordem celeste ao primeiro casal! Ninguém mais dá ordens! Ele e só Ele é o Senhor Omnipotente,
grande e imenso. A ninguém presta contas! É senhor absoluto da sua vontade!
Sendo isto assim, já se deixa ver que os homens deste mundo, pobres mortaism dependentes em tudo, carecidos, impotentes, não podem nem devem assumir atitudes que não lhes fiquem bem,

Legislar assim, é não ter barreiras que limitem a acção; é assumiir-se como autêntico deus! É fazer de si o móbil do agir!
Que vai acontecer à sociedade chinesa?

Julgo e não me engano, dizendo para já, que ela se corrompe.
Lançada a juventude, por tais caminhos, não há barreiras que possam detê-la! Cobre-se de lepra, Reveste-se prestes de toda a imundície e prepara o caminho, para que o inimigo tripudie sobre ela.
Que pode originar o contacto frequente?! Só mal-estar, gerado na liberdade, em abusos e arrojo!
Se pais e educadores se não põem de atalaia, mantendo-se vigilantes, não vale nada! Da promiscuidade, que podemos esperar?!
Só leviandade, ensejo maléfico e oportunidades que saem bem caras!
O mal dos outros serve de lição. para o evitarmos!

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Lx. Belém
1985-02-26 Mendes do Carmo

Um velho professor, assaz abalizado que, em tempos, me deu aulas de Ascética e Mística, no Seminário da Guarda.
Conheci-o muito bem, pois fui seu aluno. ao cursar Teologia!

Se bem me recordo, era formado em Teologia, Direito Canónico e Filosofia. Daqui se vê bem que era um homem dotado,
pois ficava muito acima da pobre mediania. Publicou um livro, que foi harto apreciado: Por que jurei crer em Deus. Além deste,
várias brochuras, conferências e sermões, que eram sempre de muito agrado.
Sirvam as referências de homenagem sincera à memória saudosa do notável professor que, embora aferrado à sua opinião, e muito exigente em Pontos e exames, não deixava certamente de impressionar pelas suas convcções. género de actuação e cultura geral.
Veio a propósito a minha digressão, por causa dum facto que eu observava, achando-o estranho. Hoje, porém, julgo isso aceitável, em toda a extensão. Acontece, não raro, olvidar motivações, com destino aos Diários. Observo os casos, registo-os na memória e decido anotá-los, o mais breve possível.

Mais tarde, porém, ao querer lembrá-los, não sou capaz de os trazer à luz Ora bem. Sucedia já, nos meus tempos de aluno, que via no Doutor Carmo o invés do que eu faço, mas vou imitá-lo,
assim que possa: registar numa agenda o que acho interessante,
para ser guardado e sujeito a comentário.

É facto que, já durante as aulas, já nos corredores ou ainda em viagem puxava ele de seu lápis e agenda, para tomar notas.
A mim, na verdade, fazia-me espécie tal proceder! Dizia, seguidamente, para os meus botões: para quê fazer assim, se não é
preciso?! A gente lembra-se! Para que hei-de escrever?!

Era isto, realmente, o que eu pensava!
Hoje, porém, aos 67 anos, julgo de outro modo o agir daquele Mestre e dou-lhe razão.
Nada aí há como a experiªencia! Passar pelas coisas, vivê-las a fundo e poder senti-las, faz-nos mudar o processo de sentir e até de julgar!
Naquele tempo da Guarda, com os meus 23 ou 24 anos, julgava desnecessário que ele tomasse notas. Porquê? Eu era jovem, ignorante da vida e aferia o Mestre pela minha bitola.

Claro!Esava errado! Navegava, por certo, em águas turvas!
Agora, ajuízo de outro modo. Acho conveniente fazer-me acompanhar de papel e caneta, para, no momento, lançar por escrito o que pode servir-me, de grande achega, em futuros comentários.
Ando há meses já, para iniciar o dito processo. Quando vai ser? Muito brevemente. A aproximação dos 70 anos, fala com
entono e de modo convincente. Devo respeitá-la e não me furtar seja ao que for! Fazendo assim, colherei material, para os meus Diários que desejo prosseguir, até aos 70. Isto, para já!

Depois, é que verei se tenho energia, lucidez e prontidão. para continuar. Três anos mais, se Deus for servido que eu ande por cá,
tenciono ainda fazer o Diário. É um hábito velho a que estou já preso! Não seria muito fácil desligar-me em breve, definitivamente! Algumas vezes, tenho fortes assomos que me dizem logo, imperativamente: cessa já!

E quando releio, não achando virtude naquilo que fiz?! Então, pois, é que são elas! Quase logo decido não me dar âs Letras!
Aquilo, porém, é coisa de momentos! Volvidos segundos, já estou debruçado, para iniciar a desejada escrita. Quando a largar, estarei
possivelmente, à beira da morte! Será, de facto, assim?! Talvez não me engane!
A não ser que me asseteiem, com ditos amargos e palavras
escaldantes, por causa disto e daquilo também!
Ainda então, não tenho (a) certeza se vou largar a pena!

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Lx. Belém
1985-02-27 Dureza da Vida
Até ao presente, um mar de rosas!
Sendo filha primogénita, foi recebida com grande alegria, ao vir a este mundo. É Madalena a graça da menina.Já de outras vezes lhe fiz referência. Mora na Amadora, no 2º esquerdo, sendo meu o 3º do mesmo lado. Somos, pois, vizinhos!

Frequentando já o 1ºano da Escola Preparatória, vou-.he dando assistência, para adaptá-la ao novo regime, que é bastamte diferente da Escola Primária. Vários professores, em lugar dum só; muitas matérias, algumas das quais inteiramente novas.
Em tais circunstâncias, experimentam os jovens graves dificuldades, principalmente, nos primeiros tempos. É o caso da Leninha: custa-lhe um bocado a adaptação.

Bom. Segundo o costume, ontem lá fui à cidade Amadora,
aonde cheguei, às 18 e 3o. Aí pelas 19, premia o botão da campainha do 2º esquerdo, na 27 de Junho, porta 6. Qual o meu espanto, ao ver a Leninha toda lacrimosa e fora de alegria!

Que se tinha passado? O 2º Ponto de Ciências Naturais
obtivera a referência: "Não satisfaz!"
Claro! Já fora ameaçada e repreendida mercê da nota no 1º Exercício. A desgraça repetia-se, vindo pois o que não asperava!

O senhor José Rodrigues não se ensaiou: deu-lhe uma tareia, com
promessa de mais, caso se repetisse o mesmo de então.
E a pobre Leninha encontra-se a braços com a dureza da vida1

Dez anos de encanto, beleza e carinho; tempos de mimo, enlevo e sonho! Bonecas e conecos, centenas de brinquedos,... um oceano de ventura!
Agora, porém, a coisa mudou! É o sério da vida! Efectivamente, o senhor Rodrigues, que ganha o seu pão honradamente, com o suor do rosto, não permite descuidos, faltas de atenção ou ainda preguiça.

Quer fazer dos filhos, Madalena e Ricardo, bastante mais que seus pais conseguiram, em relação a ele. É bem entendido que seja deste modo. Todos os pais desejam o mesmo. A vida terrena
inpõe sacrifícios, exigindo de todos boa vontade, muito esforço e generosidade.
Está, pois, a Leninha entre a espada e a parede!
Entretanto, averiguando as causas do tal inêxito,, cheguei à conclusão de que ela, a rigor, não podia responder Se não tinha
estudado a matéria dos vulcões!...

Perguntara eu, antes do exercício: Leninha,, que matéria vem? Diz ela prontamente: "Só vêm as rochas!
Bom, sublinhei eu: estuda bem o Ponto em vista, afim de ergueres os teus bons créditos!

Prometeu que sim. Neste propósito de sair bem, aplica-se às rochas que estuda a valer! Longe estava ela de que saíssem os vulcões! Nem olhou para eles!

Conclusão: efeito, zero, pois nada fez!
Juízo sobre o caso: alguma distracção, enquanto a professora marcava a matéria! O resultado já nós o sabemos!
Uma nota negativa e uma sova reforçada que a pobrezinha teve de aguentar!
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Lx. Belém
1985-02-28 O Presidente veta

Já por mais de uma vez me constara o facto. Entretanto, nunca a sua atitude caiu tão bem, como nesta data. Apontarei brevemente as razões que me assistem. Procedendo assim, não me leva o despeito, a inveja ou rancor..São motivos plausíveis, à margem de à-partes de qualquer natureza.

Vou impelido por motivos graves de humaniidade, razão orientada ou como dizem os nossos moralistas,"recta razão".Antes de mais: qual foi a matéria, sobre a qual recaiu o veto do
Presidente?
No momento actual, ninguém o ignora, pois está na berlinda.
Pediu-se o aumento de 5o%, sobre os ordenados quw recebem os Ministros bem como os Deputados, na Assembleia Nacional.

Tenho muito respeito e consideração, iá pelo cargo já pelas pessoas. Entretanto, olhando agora à situação económica. em que
vive no país, grande parte das famílias, saberia como escândalo a
proposta aludida. Não exagero,chamando'alarmante' a situação
económica.
Não saberem as gentes, de modo nenhum, como hão-de alimentar-se, pelo facto simples de o dinheiro não chegar!
É triste, realmente, ganhar quem trabalha só para comer, não
chegando sequer! Reina o alvoroço. a grande inquietação, a insegurança!
Pode haver serenidade?! Poderá então reinar a paz?! Ter filhos com fome, não havendo que lhes dar?! E os outros problemas?! Casa e vestuário, doenças e o mais?!Perante o facto,
levanta protestos a atitude em causa, como gera entusiasmo e grandes aplausos o veto referido à subida exposta.

Jamais o Presidente assumiu uma atitude que o levasse tão alto como esta agora! Mil apoiados do povo gemebundo, sofredor e
inseguro!
Disse eu há pouco, ser escandaloso tal proceder.Os maiores vencimentos elevam~se a montantes que mais os distanciam das
classes desprotegidas!

Por que não aplicar medida escandalosa aos ordenados mínimos?! Seria mais justo, razoávej e digno! Além do mais, prosseguindo aumento, sobre tais vencimentos, quanto ia representar, no falhado orçamento?! Mais uma carga, fazendo esvaziar o erário público! Aonde ir buscar o dinheiro suficiente, para fazer face a tantas despesas?!

Se o problema financeiro faz logo cismar quaisquer entendidos! Se milhares de contos são devidos, nesta hora , àqueles que trabalham! Com seus ordenados em atraso lastimoso
é que pode viver-se?!
O trabalho é sagrado! Ninguém pode apropriar aquilo que é doutrem! Não vai contribuir para a sua subsistência?!
Com dívida tão grande, aumenta-se a despesa, escandalosamente!
Ora, pois, abençoado Presidente, pela coragem, alto desassombro e honestidade, que revelou, nesta data! Nunca ele se arrependa, em ordem ao que fez!
O povo grato saberá compreender sua nobre atitude!

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Lx. Belém
1985-03-01 Ela viu-me e logo sorriu!

Havia já meses, que eu andava saudoso. O tempo decorria, mas em mim não passava esta ânsia veemente de encontrar-me com ela! Por mais que tentasse, não achava maneira de fazê-la esquecer!

Curioso até! Quanto mais tentava cavar um abismo, entre ela e mim, mais e mais se vincava essa imagem fagueira,nos meus olhos sedentos. Lembrar os seus encantos, a cor feiticeira de seu rosto peregrino... fixar-lhe os ademãs e o jeito característico, era para mim delícia inefável!
Como o tempo se esvaía, quando ela, maviosa, cravava nos meus seus olhos fulgurantes!

Neste encontro prazenteiro, em que os dois nos irmanávamos, tudo o mais era estranho, banal, desprezível! O mundo em redor, que tentava furtar-me aos encantos sedutores, tinha voz apagada!
Desprezei-o tantas vezes, quantas ele fez esforço, para furtar-me àquela ventura!
Raramente eu falava! Para quê fazê-lo?! Que linguagem haveria, capaz de expressar, devidamente, o que enchia a minha alma? Nestes casos, é melhor o silêncio. O que ele não diz a peitos em chama!!
Quando tal ocorria, deixava-me ficar, mergulhado na ventura que o silêncio animava. A minha vida e a dela encontravam-se num ponto: viver a delícia que inundava o peito.

Fora grande este sonho, enchendo-me o seio de maravilhas sem par! Ninguém o conhecia. pois o ocultava a olhares indiscretos. E, então, arroubado, vi-me descendo ao lago do incrível! Deixei-me ficar, por tempo alargado, soltando monossílabos que tudo expressavam! Era já o cúmulo! Ninguém percebia, mas íamos penetrando no lago da ventura!

Depois, não sei como, vi-me despojado, por modo inexplicável, de quanto havia amado! Ela não estava! O meu sonho dissipara-se! Encontrei-me sozinho, no mar encapelado, nadando a custo, sobre ondas furiosas!
Em perigos e reveses, prossegui no meu avanço, luzindo, ao longe a flama da esperança. Com mil diligências, enorme esforço e alta porfia, cheguei então à praia ansiada, choroso e sedento, de haver perdido tão grande bem. Nada valioso podia encantar-me! O meu mundo era outro!

Pudesse eu recuperá-lo, voltando a ser aquilo que fora, em meses de encanto!Ela voltaria?! Esperei, confiado, sempre alerta no meu
posto, aguardando com ânsia novo encontro feliz. Não perdi o tempo! Ele pôs-se a caminho, envergando, como usava, seus trajos de festa!
Vinha bela e adornada, sequiosa de encontrar-me, anelando a fundo pelo momento do nosso encontr.
Essa hora chegou e, avistando-me de perto, já não pôde conter-se! Fitou-me e sorriu!
Era a Primavera que vinha, de novo, alegrar-me a existência.

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Lx. Belém
51985-03-02 Um Boneco

Bonecos e bonecas respeitam a crianças, de modo especial, se forem meninas.O instinto materno surge logo espontâneo, figurando em coisas o filho amado.

Desta maneira, a criança expande-se, aviva e nutre, já precocemente, o ideal a realizar, em futuro distante.
Por outro lado, essa inclinação que brota da alma, onde fora
instilada pelo Criador, acha logo ambiente, no meio familiar,em que tudo lhe fala de amor e carinho, votado às crianças.

O boneco e a boneca são, desde logo, o alvo de seus afectos,
agindo a menina qual mãe extremosa .
Nesta ordem de ideias, cuida solícita do caro objecto de seus
amores: lava e embala; acarinha e adormece, vela a toda a hora pelas suas comodidades; pensa no vestuário e defende-a dos perigos. É isto, na verdade, o que todos observamos, no breve dia a dia que vivemos na Terra.

Ninguém estranha: todos acham bem aprovam e louvam.
Assim achei o mundo, assim o encaro e nao vou contestar o que todos aprovaram, ao longo dos séculos, dando expressão ao que o Grande Arquitecto gravou indelével, no peito das crianças.
Bom. Esta é, na verdade, uma parte do disco. Vejamos agora a face oposta.
Aqui há dias, telefonou-me o Serra que, devez em quando, se lembra de mim, recordando velhos tempos, decorridos, em Manteigas, no Externato da vila. Trocámos impressões, acerca da labuta que a todos impele e, por fim, remata ele: " Já cá tenho o boneco!"
Quis eu adivinhar o tal objecto, mas ele não deixou que eu entrasse em conjecturas. Juntou apenas: Depois lhe conto! E logo desligou!
Deixou-me o Serra, esse bom amigo, que reside na Amadora e trabalha porfioso, na Tabaqueira, aqui, em Lisboa, em grande alvoroço e funda ansiedade.

Tanto mais que não quis elucidar-me, cortando o diálogo que bastante me incitou. Ninguém estranha decerto a minha reacção, pelos motivos, em parte aceitáveis que já vou expor.

O amigo Serra não é já criança, para lidar com taus bonecos. Ainda que o fora, os ditos bonecos respeitam a meninas. Se me lembrar ainda que esse bom amigo ultrapassou os 30, mais uma razão que milita contra ele!

Bom! Neste labirinto, em que ando enredado, não terá parte a Dona Adriana, legítima esposa?! Será de crer (inclino-me para isso!) que se trate realmente, dum boneco de carne?!
Adivinhei? Sendo assim, está de parabéns omeu bomm amigo e a cara metade! Já coabitam, há mais de 4 anos!
Serão as primícias do seu matrimónio?! Deixo, pois, aqui, muito bem expresso, o meu regozijo, pensando gostoso que não tenha errado!
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Lx.Belém
1985-03-03 Um Cego a conduzir

Parece absurdo, mas é verdade.
Antes de expor as graves circunstâncias, por mim observadas, avaliemos, de longe, os efeitos nefastos que pode originar
uma acção do género. Claro se deixa ver que, de modo nenhum,
eles podem evitar-se

Que seria de nós, sefôssemos levadus por gente cega?! Não vendo, afinal, precisam que alguém lhes dê a mão, caso contrário, estatelam-se prestes, o mesmo acontecendo a quem eles se juntam. para os guiar. Neste passo, objectaremos logo: quem pode haver aí que aceite a posição?! Ser guiado por um cego?! Não!

Protesto veemente que brota espontâneo do íntimo da alma!
Ninguém consciente aceita o papel É indiscutível! Outro aspecto ainda algum cego,aí, se arroga competência, para conduzir quem veja alguma coisa? Parece que não! Entretanto, no caso especial que estou visando, surge um ceguinho prestando-se a isso. É preciso ousadia!
Que falta de sensatez! Curteza de vistas? Elevado conceito da sua pessoa? Demasiada estima de alguns predicados que harto enobrecem? Ainda neste caso devia coibir-se de tal insensatez! O que importa é ver, no caso presente! Sem o uso pleno desta faculdade, como pode alguém indicar a via que outros vão seguir?!
A verdade, porrém, é como segue: ainda há poucos dias, estando eu presente, melhor direi, sendo eu protagonista, a dialogar com outrem, aqui em Lisboa, versávamos un tema, relacionado com árvores. Uma vez aqui, vieram a pêlo os ingredientes, para defendê-las de certas doenças e alguns inimigos.
Falámos das formigas e outros insectos, que são danosos.
O meu interlocutor referiu-se a um produto que utiliza amiúde, com vista a protegê-las da praga das formigas. Dizia, pois: "Coloco a massa no caule das plantas, rentinho ao solo, disponho-a ali em forma de anel e aquilo não falha!

Mas é preciso não cortar a casca nem danificá-la. Sabe a razão por que eu a mantenho? É que as plantas respiram por ali"

Apeteceu-me perguntar-lhe logo, ao dar o remate: então, diga lá para que servem as folhas! Entretanto, lá me fui calando. não se desse o mesmo que o ano passado, ao querer elucidar a certo sujeito, acerca dos efeitos do astro luminoso, tomando em conta a obliquidade dos raios solares.

Troçou de mim, rindo à valentona, quando lhe indiquei a razão científica. Daí por diante, sejam eles cegos, deixo-os estender, a
todo o comprido!
Voltando à vaca fria: o dito sujeito está convicto de que, tirando ao caule um anel de casca, a planta morre, por não poder respirar!
Que ela morre sei eu, mas não é por isso! Não pode alimentar-se, pois a seiva elaborada que vem já das folhas, onde é
preparada, caminhando logo, rumo à raiz, vai passar, exactamente, entre a casca e o lenho!

Não obstante o facto e a estupidez do meu interlocutor, fiquei tão mudo, que nada mais disse.
Foi ou não verdade que um pobre ceguinho tomou o leme do barco, levendo-o a capricho, sem nada perceber do assunto em causa?!
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Lx. Belém
1985-03-04 Machel e Eusébio na televisão
Há dias, acompanhei, interessado, o encontro de Machel com o célebre jogador que todos conhecem.

Este facto deu-me que pensar, por vários motivos. Entre eles, porém, saliento um, que parece emergir, em todo o conjunto:
a doação duma casa, feita a Eusébio. Pelos dados que obtive, ao
longo do diálogo e, juntamente, por informações, que a imprensa forneceu, o famoso Eusébio andava descontente, porquanto, em 74, a Revolução actuara em Moçambique, apoderando-se dum predio que tinha em Maputo, para rendimento.

Sendo isto assim, havia já10 anos que o infeliz jogador se
encontrava defraudado! Não houvera, de facto, indemnização, por
aquela rapina. Como olharia o regime da Frelimo?!

Bom! Em nossos dias, Machel reflectiu e chamou o jogador à sua presença, afim de compensá-lo e lhe dar alegria. Fez-lhe então saber que era senhor duma boa casa, na capital.
O mesmo presidente lhe fazia a entrega, com muita admiração, amizade regozijo.

Até aqui, pouco tenho a dizer. Considerado o facto, meramente, a priori, julga-se bom tal proceder.
Indemnizar a qum roubámos ou de algum modo foi lesado ou
de algum modo foi lesado por nós, é digna atitude que merece louvor!
Eusébio, porém, ganhara aquele prédio. à custa do seu ofício. Pertencia-lhe a ele: a mais ninguém! Inteiramente de acordo, no tocante ao primeiro!

Quanto ao segundo, as minhas reservas começam de emergir! Vejamos então os dados precisos do grave problema.
Em primeiro lugar, o jogador tinha direito a uma casa mobilada, como estava a dele; a oferecida, segundo me parece, não tinha mobília
A quem pertencia a casa oferecida? Era a Machel pelo facto simples de a mandar fazer, pagando o custo? Neste caso, muito bem. Dava o que era seu. Já o mesmo não afirmo, se a dita casa
pertencia, de facto, a um proprietário que fora espoliado.

Em tais circunstâncias, nem Machel nemmais ninguém deve utilizá-la, por não lhes pertencer! ´´E conveniente lembrar ao chefe que deve indemnizar os que foram espoliados, em 1974.
A Lei Eterna diz claramente: 7º não furtar!.
Quantos sacrifícios não hão-de ter custado as ditas casas e outros haveres?! Quanta poupança, noites de insónia,, longo pensar e fadiga sem limites?!

Restituir é honrada atitude. Embora presidente, há outro acima: o Presidente eterno! A este dará contas da sua administração. O Grande Presidente, uma vez sepultado, ergueu-se do sepulcro, ao 3ºdia, Quer dizer: ressussitou.

Machel e eu, assim como todos,só ressussitmos, quando Deus o entender e por seu intermédio.
Somos pobres criaturas que havemos de ser julgadas, pelo eterno Presidente! Vê, pois, Machel, em que alhada te metes!
Indemniza e compensa, antes que Deus-Pai te chame a contas, para expores os teus casos e ficares aterrado, com tanto latrocínio! Quem nos avisa, sempre bem nos quer!

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Lx. Belém
1985-03-05 Maria de Lurdes

A caminho dos 80, vive em Lisboa, como asilada, no Lar da Junqueira. 6. Movimenta-se bem e fala de tudo, com bastante à-vontade, revelando cultura e muita experiência que não é vulgar, em pessoas anosas. da sua qualidade. Discute animosa qualquer assunto, seja ele político, social ou religioso. Segundo ela diz, foi
criada de servir, ao longo da exstência.

Natural, como informa, de Fornos de Algodres, no distrito de Viseu, concelho de Fornos, trouxeram-na a Lisboa trabalhos inesperados.
Gostava imenso de cantar na igreja. Por esta razão, aproveitava as tardes, no fim de semana e também às quartas- feiras, para se deslocar à igreja de Alcântara, pois fazia parte do grupo coral. Era um desafogo, para a sua alma!.Louvava ao Senhor e trocava inpressões com pessoas amigas, tentando arejar.
Bom. As coisas da vida iam de feição, mas o demónio, que é sempre travesso, prega partidas, quando lhe apraz.
A misa da tarde inucia-se ali às 19 horas.Por esta razão, cerca das 20, preparava o regresso, que fazia a pé, num percurso breve de 4 paragens dos transportes públicos. Nada lhe custava. Creio até que o fazia com prazer.

Há coisa de três semanas,acontece então o inesperado.
Voltando, por noite, ao Lar da Junqueira, alguém a seguiu, com más intenções. Infelizmente, ocorrem por aí cenas do género, com
muita frsquência.
Diziam mal do fascismo! Muitas pessoas já estão saudosas
desse tempo fantástico, em que havia segurança. tanto nas pessoas como em seus bens! Hoje, ao sair, ninguém sabe se volta, na sua integridade!
Havendo mudanças, há-de ser para melhor!
Que sucedeu então à infeliz azilada? Caminhando satisfeita, dirigia-se ao Lar, enquanto os meliantes ( eram 2 rufiões !) a seguiam atentos, olhando fixamente para a velha carteira, que ela
sobraçava.
Que podia levar dentro uma pobre asilada, que fora toda a vida mera servente?! Esperaram somente que ela entrasse, aproveitando logo o ensejo oferecido, para executarem a rapina intentada! Uma vez no interior, ao 3º degrau da escada ascendente, atiraram-se à velhinha, para roubar a pobre carteira.
Em sua tentativa, na mira de resguardar-se, nada consegue,
pois a violência e forte impulso, com que fora sacudida, fê-la cair, rolando e ferindo-se. nos membros superiores. Assim foi encontrada!
Os gatunos fugiram, levando consigo os objectos dela. Ninguém abe quem foi! Alastra o crime, nesta capital, que foi grande e honrada. em tempos idos.

A infeliz Maria de Lurdes está ainda ae cama, não sabebno agora por quanto tempo, ali se manterá!
Segundo ouvi dizer, incham-lhe os braços. Um dois ficou estilhaçado!
Pobre mulher! Que mal fazia?! A quem prejudicava?! É isto
democracia?! Canibalismo é que ouso chamar-lhe!
Quando cessará esta onda de crimes?!
Teremos algum dia um governo que governe?! Assim, infelizmente, ninguém está seguro! É uma tristeza!

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Lx. Belém
1985-03-06 Ir à frente.
Pode tomar-se em vários sentidos a expressão escolhida para este Diário. Na acepção usual.logo reconhecida, não tem dificuldades, pelo menos, ao que penso. Noutras aplicações, já exige estudo, para novos casos que haja a deslindar!

Encarada, a frio, aquela expressão fala-nos claro de tomar a dianteira, no tempo ou no espaço. Para que isto se dê, intervêm factores que actuam diversamente: uns, a favor; outros, contra o facto. Assim: o vento propício vem facilitar; pernas sadias e forte coração, de modo igual; necessidade prmente, de igual maneira,
contribuindo também para tal acção.

Em sentido inverso, militam factores que vou apontar: velhice e doença; vento desfavorável; grande má vontade ante-cheiros e atitudes.
Não é meu intento, de modo nenhum, apresentar, de momento, os casos todos.A+enas alguns. que me vêm pronto à imaginação.
Como factor, um tanto desfavorável, podia juntar a temida inveja, e como favorável a bela harmonia e boa convivência.
Vem isto a propósito dum caso recente.

Indo eu para Alcântara, logo de manhã, o que faço diariamemte, surge-me um jovem que é fumador e toma dianteira. Perante o facto, encho-me de nervos e tento, desde logo, apressar o andamento.
A situação é grave, pois tento seguir, na mesma direcção. não posso recuar nem fazer devios. Ele, no entanto, vai encantado, ao passo que. em delícia absorve as emanações, geradas pelo fumo.

Para ele, os outros não contam. Sendo feliz, importa-lhe o mundo que sofre â volta?! Incomoda e martiriza? Que lhe unteressa, afinal?! Não vai satisfeito, penetrando, a valer, na essência do tabaco?! Como vai inebriado, os outros que se arranjem! Nem contam sequer!
Apesar de tudo, eu que sou filho de Deus e um ser racional...
que tenho os meus deveres e- decerto, os meus direitos ... que aspiro ao Céu e por ele me bato... vou ali amarrado, confundido e
humilhado, sob aquela emanação, que é repulsiva e deveras nauseabunda!
Bem me esforço eu, mas que fazer?! Queria avançar tomando a dianteira, mas ele é jovem, e eu quase velho; as minhas pernas repontam, e as dele funcionam; o vento importuno dificulta- o
avanço, trazendo o fumo para dentro das narinas.

Que fazer ali, ante a inconsciência?! Que solução dar, se eu me defronto com irresponsáveis? Como defender-me, sendo tudo contrário?!
Jovem molesto, alheado, esquecido... rapaz egoísta e assaz indesejável, +or que não atendeste a quem importunavas?! É assim que procedes?!
Qual velho pagão sacrificas somente, nas aras do egoísmo,
relegando firme para a indiferença os direitos dos outros?!

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Lx..Belém
1985-03-07
"Casa onde há muito dinheiro há pouco amor!"
Foi há dias apenas, que ouvi o anexim a uma senhora, residente em Alcântara, Ignorava tal provérbio.
Havendo pensado no alcance dele, resolvi pronto dedicar-lhe um Diário, por julgá-l o conveniente.

" Onde há muito dinheiro"
Juntar em barda, supõe sacrifício, trabalho exaustivo, cabeça afinada e, por vezes, falta de escrúpulo. A última cláusula nem sempre existe. Entretanto, esforço e poupança, assim como orientação, deveras inteligente, lá iddo é preciso!

Procedendo como digo, há forçosamente lucro visível, quue se traduz em aumento, novas exploraç~pes e outros derivados.
Bom! Isto ocorre, mercê das circunstâncias. Apesar de tudo, há também despesas: algumas obrigatórias; outras que são livres.

Os avarentos ou ainda ambiciosos, suprimem as livres, com que podem obviar a casos diversos. Primeiramente em casa: vestir melhor; comer e beber, sem restrições; adquirir mobiliário que esteja em dia; procurar o que interessa, para haver o necessário,na
despensa e na cozinha, bem como ainda na sala de jantar.

Em segundo lugar, há também várias carências a que manda atender a caridade cristã: pobreza envergonhada; Hospitais e Asilos; Infantários e Escolas; Igrejas e Seminários; Leprosarias e Gafarias;Instituto Oncológico; Cruz Vermelha e Caritas; Imprensa e Rádio bem como a Televisão; Investigação científica;
Missões e o mais.

Acumulando muito, faz de Mamona o deus que adoram. Para o monte subi, tudo sacrificam: eliminam-se despesas; cortam-se gastos; tudo se encaminha num único sentido.

Bem parece, pois, que o provérbio em causa esteja correcto.
É que o amor gtem mãos abertas! Atende sempre âs necessidades; investiga e apura; sente prazer em ser útil aos outros. Tal generosidade leva a pessoa a dar o que é seu e ganhou com honra,
aplicando as faculdades.
Seguindo esta via, o monte não cresce: tende, sim, a perder volume.
O avarento priva-se tudo, aplicando aos outros a mesma bitola. Por tal razão, em vez se amor, vai medrando nele o asqueroso egoísmo. Obrigá-lo a dar, seria destruí-lo!

A sua felicidade reside naquilo: só amomtoar! Tudo convergir no mesmo sentido! Nada cercear do que chega às mãos. Necessidades alheias? Isso não conta! Os outros que trabalhem,
imitando quem sobe!
Estão, pois, em campo ideias antagónicas: amor e egoísmo;
liberalidade e sórdida avareza. O primeiro despoja-se, com vista ao bem alheio; o segundo locupleta-se, com vista ao bem próprio.

Sempre é verdade que estão, realmente, na ordem inversa,
estes dois conceitos: amor e egoísmo; avareza ainda e iberalidade
Quando um sobe, diminui o outro. Se o primeiro decresce, aumenta o segudo
Amar é dar, em vez de receber; amonttoar riqueza é, desde logo, logo, olvidar os ouyroa, sem compaixão oela sua desgraça.

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Lx. Belém
1095-03-08 Uma Visita

Havia muito já, que estava na agenda. De dia para dia, o tempo escoava-se, e o meu objectivo ficava sem vez. Entretanto,
a ideia persistia e mais se firmava, com nitidez e grande aferro.

Trata-se da viúva do célebre Engenheiro, Duarte Pacheco, que no tempo de Salazar, foi como é sabido o famoso Ministro das Comunicações. Ninguém desconhece este nome ilustre e digno de apreço. Pois a dita senhora, que j´fez 90 anos, enviou-me pelo Natal, um cartão de B.F., juntando amavelmente 500$00.

Fiquei desde logo sensibilizado, assentando comigo ir ter com ela, a sua pr+opria casa, no Largo do Calvário, Porta 6, 30 -
2º Esquerdo. Nunca eu falara, a sós com ela, e mal a conheço.

Via-a raramente, sempre acompanhada por outra pessoa, uma
senhora macróbia, vestida de preto, salientando-se os cabelos,
alvos de neve. Num fundo nrgro, haviam de emergir, por força das circunstâncias.
Dupla razão me levava,pois, ao seu encontro: agradecer, penhorado, a sua lembrança e votos sinceros de felicidade; conhecer pessoalmente aquela que fora esposa dum homem notável - o Engenheiro, Duarte Pacheco.
Bastante lhe deve estebelo País! Aquele senhor era incansável
O tempo da vida, como na Inglaterra, não podia perder-se! " Time is money!"Dum lugar para o outro, a grande velocidade, é que ele visava a correspondência. Aproveitava também, para dormir um pouco. Nem para isso havia tempo! Mercê do facto, insistia amiúde com o motorista: " Às tantas horas, hei-de estar lá!"

O acelerador ia logo ao fundo, porque o senhor Ministro não podia faltar! Nestas correrias passou o Engenheiro a vida inteira, até que um dia sobreveio a desgraça: um desastre lamentável ceifou-lhe a vida, retirando-lhe assim tão grandes canseiras!

Era, de facto, um senhor de horizontes dilatados e de altos projectos. Para ele, não havia obstáculos, fosses quais fossem!
Tudo isto, afinal, me trazia alvoroçado, querendo eu ouvir,
da célebre viúva, bastante mais do que já sabia. Neste propósito, decidi breve encontrar-me com ela. Vou, pois, ao Calvário, ali em Alcântara, levando a minha alma em grande regozijo. Subo a escadaria, já no interior, e procuro atento o número 30.
Ao premir da campainha, surge um cavalheiro, a quem fiz saber o propósito firme que me levava ali..
Havendo-me escutado, junta decidido:" Não! Aqui não mora ela!
Pode ser noutra parte!"
Fico prostrado, às palavras do velhote. Que haveria ? Arrisco-me então a perguntar o seguinte: que andar é este?
-- É o segundo!
-- Ah! Desculpe! Subi demais! É logo no primeiro!
Bom. Lá vou ao primeiro, atendendo-me ali a governanta, qu logo esclarece: " Olhe, desculpe, a senhora levanta-se mais tarde, que a
manhã está fria. Posso transmitir-lhe o que for necessário.
Assim terminou a ansiada visita que não chegou, por fim, a ter sua vez!
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Lx. Belém
1985-03-09
AvelãsNunes

Há coisa de semanas, veio a Portugal o novo Presidente do Grande Brasil. Como é natural, foi ovacionado e objecto de carinho, em todos os lugares, por onde passou. Não faltaram sorrisos, abraços e louvores! O que honra o Brasil honra-nos também.
Sentimos, por igual, humilhação ou vitória! Está isto gravado no íntimo do ser! A sua grandeza afecta-nos ao máximo. É quase o mesmo que a nossa grandeza. E brota espontâneo este sentimento que se gera na alma e ali se detém!

A grande nação que é já colossal, a segunda por certo do Novo Continente, há-de ser, no futuro, uma glória da Terra!

Voltando ao assinto, afim de expressar o que Portugal delineou então. para honrar o Brasil e os homens que o servem, surpreendi, na televisão, a cerimónia tocante, na qual Tancredo Neves recebia, em Coimbra, o grau apetecível de Doutor honoris causa.

Decorreu a cerimónia, claro se deia ver, na velha Universidade. Tudo isto encantador, maravilhoso e justo!
Associei-me também, na grande capital do mundo lusófono e civiliizado, ao louvor e aplausos que lhe foram tributados..

Mas a que propósito vem o nome do topo? Muito simplesmente! É que vi, entre os Lentes, um daquele nome. Ao
ouvir pronunciá-lo, enchi-me de alvoroço! Foi, na realidade, como um raio esplendoroso de luz e calor que pronto me atingisse, inundando-me logo de enorme ventura!

Outros soaram, mas nenhum me falou... nenhum me disse coisas que minha alma entendesse! Aquele, sim! Sabia-o há muito, pois o aprendera, nos tempos de Pimhel, onde foi meu aluno, do primeiro ao quinto ano. Jamais pude esquecê-lo! Era um jovem arrumado, brilhante e cordial, sempre cumpridor, correcto e gentil.
Por estas razões, ao ouvir o seu nome, alegroi-se vivamente a minha alma saudosa. mas então porquê esta funda sensação?
Algo semelhante ao que sente o pai pela glória do filho? Já
estou em crer que de facto seja! Passaram vários anos,mas isso não bastou
No ano lectivo de 1950-51, já eu leccionava, no velho Externato de João Pinto Ribeiro, onde permaneci, durante 7 anos.
Várias centenas de excelentes rapazes e simpáticas meninas frequentaram as aulas, no período citado. Dentre eles, alguns houve que subiram muito alto, o que eu já previa, desde aquele tempo
Avelãs Nunes pertencia ao número. Apesar de tudo, era sempre modesto... nunca basófia nem abusador!
Rapaz maravlhoso que honra Pinhel, a família de sangue, os pro-
fessores e a mesma Pátria.
Que ele realize o sonho de ventura que seu peito gerou!
Aqui deixa um abraço ao querido Avelãs o velho professor que nunca o esquece.
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Lx. Bel«em
1985-03-10 Ao que isto chegou!

Vim agora mesmo do Largo do Calvário. Quando ali passo, lanço o olhar pelos vários títulos dos nossos jornais, entretenho-me um pouco e ouço os cauteleiros bem como os ardinas anunciando o artigo que interessa alijar. Não faz excepção o velhote do pau.
É, geralmente, um cabo de vassoura ou outro qualquer.
Amando em extremo a variedade, esmera-se o macróbio em diversificar! Por via de regra, é bastan te comprido, Faz questão disso! À forma não liga!
Os cauteleiros, em véspera de sorte, não se podem aturar!
Há um dentre eles que tem a voz mais fraca, mas todos os outros são pavorosos! Fujo, que me desunho!

Pois o homem do pau, com surpresa enorme, cá da mimha parte, desarmado! Com as mãos nos bolsos, entoava canções ou algo do género. Fixando os cartazes, detém-se lomgamente, olhando para as imagens.
Apraz-me também fazer já menção de doutro bom velhote
(este não destoa) que vende jornais, cautelas e revistas. Geralmente, está sentado e faz-se acompanhar de velha bengala.
Quando se movimenta, apregoa a bola, mas quase em surdina! Só consegue ouvi-lo quem se aproxime. Este é dos meus!
Há poucos dias, acerquei-me dele, enquanto dizia: "O Diabo!"Ele entâo passa-me o Diário!

Ao desandar, relanceando os olhos, noto o equívoco.
Volto à procedência e observo-lhe o engano! Fica desgostoso e
junta prestesmente: " Mas então não chega!"
Está bem - tranquilizo eu e junto sem demora 10$00 mais

Alguém dirá que tudo isto é normal e que~, portanto, não mere reparos! Pois eu não contesto! Longe de mim! O caso, para já
é que não acabei! Hoje quis alargar o meu campo de acção.

Levado, então, por curiosidade,entro numa cabina, só para ver quanto agora se paga, por cada período, em chamada telefónica.
Com esta ideia, olho para os dizeres e noto à frente: 5$00;
2$50. São, pois, duas moedas que entram, de cada vez!

Enquanto fixava tais requisitos, olho para o soalho e noto com espanto que se encontrava sujíssimo! Deu-me a impressão dum lugar imundo! Algo semelhante a qualquer montureira, da qual sentimos nojo. Levou-me este caso a fugir sem demora! Estava linge de esperar esta grande javardice!
Claro! Para estar limpa. há-de haver emregados que tratem do assunto!
Mas não! Em baixo, a canada lixosa consta de beatas e vários envólucros de naços de tabaco
Isto de atirar ao chão seja o que for, não é timbre peuliar de gente asseada! Devo concluir que farão a mesma coisa, lá por suas casas!
Que grande porcaria! Por que não encarregam a nossa Polícia de velar por isso, obrigando os transgressores a manter a
limpeza?! Aquele que suja é que deve limpar!
Os vizinhos sepanhóis dão-nos o exemplo!

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Lx. Belém
1095-03-11 Haverá motivo para indignação?
A vida humana é cheia de problemas que surgem de improviso: umas vezes, por culpa nossa; outras, por causa alheia.
Aqueles riscos de que somos causa aceitamo-los pronto, embora, já se vê, com repulsa natural, que procuramos velar.
Mercê da vaidade, que a todos afecta, ninguém existe aí que dê parte de fraco!
Assim: esteja embora em fogo o peito humano, aparenta logo coisa diferente, para iludir. Se, porém, são os outros que erguem dificuldades, reagimos em força, alegando razões e dando
provas.
E se tais problemas afectam em cheio, arruinando a saúde e erguendo barreiras ao nosso ideal?! Então, o facto baralha-se e gera, desde logo, complicações em barda

Foi esse o caso, na semana passada.. Por me haver indisposto e ferir em cheio os meus sentimentos, aí ftca o protesto e repúdio veemente do facto ocorrido.
Na Base de Tancos, faz a recruta um sobrinho meu - o Isaías, que tratamos por Quim. Segundo ele conta, não acha fácil,
como esperava, levar o Curso até ao fim. Entretanto, embora realmente com graves dificuldades, logo de princípio, foi-se adaptando.
Como deseja ficar, vence estoicamente as dificuldades.
Ao passo que muitos já desistiram ou foram arredados, ele
permaneceu, até que, por fim, jurou bandeiras, cerimónia ocorrida, há pouco tempo.

Exultou de alegria, como todos nós que bem o conhecemos.
Em seguida, veio naturalmente a segunda fase: o Curso fascinante de paraquedismo, uma vez que pertencia â tropa especializada, na Força Aérea.

Se bem me recordo, já passaram 15 dias, em provas físicas,
iniciando hoje, segunda-feira, o lançsinal, que vai um tempo esplêndido!
Costuma ele vir, no fim da semana, Sexta de tarde, para seguir, Domingo, quando já por noite.
Embora confiado, persistente e decidido, apresentou-se algo
constipado, com dor de cabeça e alguma tosse. Estranhando nós o caso em foco, perguntámos a causa

Foi então revelado o que vou contar e que eu detesto, verbero e reprovo, com toda a minha alma! Acho até que devia ser caso para uma denúncia, apresentada a quem de direito. Nem eu sei
por que o não faço! Entretanto, que não se repita!

Os atingidos foram só dois: o Isaías e outro.
O Superior-Instrutor, já por noite fora, chama-os a ambos,
manda-os despir e sentar em seguida num monte de t. Para coroar, regou.lhes o corpo com água fria.

Reputo isto um acto selvagem, agressivo e desumano, intolerável até! Digo e repito: é vergonhoso que isto se dê, na tal Especialidade! Tanto mais que ele é dócil, respeitador e bem inclinado.
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Lx. Belém
1985-03-12 Cont.
Perguntar-se-á: por que é que obedeceu?
Tratando-se de "praxar", como eles se exprimem, já não se itegava na chamada 'instrução'.Era, pois, um acto extra.
O jovem obedeceu, por se tratar do próprio Instrutor..Em ordem a ele, não passaria de mero subalterno.
Em meu entender, podia excusar-se! Fora eu, que não obedecia!
Tanto assim era, que ao chegar o facto aos ouvidos do Capitão, logo desaprovou, recomendando aos rapazes que nao obedecessem, caso se repetisse! Perante o sucedido, não tenho palavras que exprimam, a rigor, a repulsa que sinto, por acção tão
vil!
Concordo, realmente em que, durante a instrução, os sujeitem a provas que exijam sacrifício, agilidade, renúncia e dextreza. Outra coisa não se espera, evidentemente. Além do mais, que disciplinem os jovens, de tal modo e feitio, que a sua vontade fuque subordinada, sem discutir preceitos e ordens. Tudo
isto compreendo, muitíssimo bem, porque o acho razoável e necessário.
Agora, tratar um ser humano, que merece respeito e cobsideração, como simples objecto - menos que animai! - é
degradante, quase insensato e condenável!

Não vemos estimar os próprios câes e tratá-los com carinho,
não obstante o seu destino acabar n morte!
Ora, o ser inteligente, com alma imorttal, remido na cruz pelo sangue precioso de Jesus Cristo, merece, por ventura, menos que um bicho?!
O tal facto é deveras humilhantte, repugna e desdiz, fere , indispõe!
Se passamos agora ao campo da saúde, o caso referido não é menos reprovável Que dinheiro aí há que pague este bem?! É que ele, de facto, não se pode comprar! Uma vez perdido, jamais se reencontra!
Como vai então o aludido Instrutor indemnizar o pobre Isaías, ficando a sofrer, por causa de caprichos, deveras condenáveis?!
"Já vem de trás..." Que me importa amim que venha de trés ou que surja de frente?! Os outros não viram? Sofreram e calatam.se?
Por demais sabemos que toda a Humanidade se encontra evoluindo. Ela caminha, realmente, no sentido exacto de reencontrar-se. A priori se deduz que procura o equilíbrio, a recuperação do que foi cerceado... o ajuste de contas, a repulsa e rejeição de quanto a molestou.

Vemos, pois, que o facto simples de vir detrás nad justifica,
ante os graves sinais que a época actual vai apresentando.
O dito Instrutor olhará sem ver. Na minha estimativa, devia ser chamado a prestar declarações, respondedo por seus actos.

Que ao menos o facto não venha a repetir-se: depõe altamente contra a dignidade que o ser humano traz consigo.
Uma vez que se trata de Corpo Especializado, que o seja em tudo! Ainda na maneira de conviver e lidar com o semelhante!
São eses realmente os votos que faço, nesta hora amarga!

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Lx. Belém
1985-03-13 Alfragide em foco

Estar na berlinda pode tomar-se em dois sentidos: um, lisonjeiro, honroso, desejável; outro, humilhante, desairoso, repulsivo.
Podendo nós escolher,optamos, já se vê, pelo primeiro sentido. O segundo, infelizmente, ocorre muitas vezes, já por culpa nossa, já por falta alheia.

Gostaria, nesta hora, de expor, no meu Diário, factos relevantes ou pelo menos, que não destoassem, por maneira excessiva. Entretanto, não vai ser o caso! Antes de mais, relato desde já o
que houve ante-ontem, na carreira diária da Venda Seca, procedente de Alcântara, freguesia de Lisboa.

Era o auto-carro das 13 e 16, ao passar por Belém. Na rua da
Junqueira, perto já do Museu dos Coches, aguardavam a chegada umas 10 pessoas. Entre elas, havia estudantes, dos seus 17 ou 18 anos. Seriam, talvez, em número de 5. Isto, pelo menos.

Além destes rapazes, havia também alguns adultos. Entre
estes, figurava um que usava chapéu, em vez de boina. Esta fez-se moda.
O facto em si chamou a atenção, como é natural, nas sendo gente educada, ficaria por ali! Entretanto, se bem que isso pese à terra de origem, os ditos jovens ou parte deles são atrevidos harto
malcriados e sem vergonha.

Havendo-se instalado, nas traseiras do carro, para estarem à-vontade e se mostraren cobardes, iniciaram um gracejo que bem mal os colocava. Utilizando papéis, bastante comprimidos, em forma de bolita, apontaram ao chapéu, no qual acertaram, por duas vezes.
À primeira, o senhor olhou, mas nada expriniu que denotasse incómodo ou forte reacção. Já o caso mudou, à segubda insistência! Ferido nos seus brios, dignidade e capricho, fixa-os longamente, esperando se excusasse, pedindo que os desculpasse.
Mas não! Mudos como ratos e de ar petulante, ninguém se descoseu!
Vendo ele o sucedido, irrompeu sem delongas em ditos empolados e cheios de veemência. " Já que não têm barba, ao menos tenham vergonha!"
Estes dizeres, cheios de calor e recriminação fê-los sacudir
e encher de confusão.
Undeles, talvez reprovando, objectou seguidamente:: "Foi este aqui!
O caso passou, como tudo, neste mundo. O que não pasa já é
desvergonha e falta de senso, que ferem ao vivo as pessoas de bem.
******

Lx. Belém
1985-03-14 Marcos

Servem, no geral, para dividir, separar terrenos, aclarar siuações. Vi-os tantas vezes, lá na minha aldeia, a indicar os limites de pequenas hortas e leiras de cultivo!
Não raro sucedia vir alguém mudá-los, já por noite velha, para assim alargar a exígua propriedade! Esta facto matreiro logo
originava desavenças tremendas!

Ao ser notado, surgiam conflitos, que geravam problemas
Ambição e inveja redundam amiúde, em sérios despropósitos.
Vi também marcos delimitando fronteiras, já de países, já de concelhos ou maiores extensões, como são os distritos.

Quanto a fronteiras, vêm ao de cima casos diversos, ocorrdos geralmente, ao longo do tempo. Nesta hora, apraz-me citar, como linha extrema a que separa Angola do Sudoeste Africano (Namíbia). Entre muitas outras, gravou-se esta mais, devido às circunstâncias em que eu me encontrava..
Era em Agosto de 1975. A 26, um domingo triste, se bem me lembro, arrancávamos de Angola milhares de pessoas, com ddestino incerto, por matas e areais. Andámos, andámos, à torreira do Sol, com temperaturas a 60 graus.

Nenhum crime infando se havía cometido, mas a insegurança, a falta de recursos e os perigos constantes amarguravam a fundo a alma de cada um. Atravessámos depois a ridente Serpa Pinto, rumo ao Caiundo, para se ultrapassar a região do Savati.

Pernoitando sem abrigo, aqui e além, como exilados e autênticos precitos, animava-nos então uma esperança fagueira:
entrar seguidamente na África do Sul, que se apresentava a nós qual terra prometida, após tais dissabores e tratos desumanos. Terra de promissão? Veríamos em breve!

Passados 8 dias, atigíamos, pois, a fronteira da Namíbia.
Já se não pisava aquele solo amado, que o sangue português tantas vezes regara, para o conservar, defender e exaltar! Que saudade e que mágoa,só de pensá-lo Mas os homens são maus,,
invejosos ao máximo e cheios de ambição!

Chegados à fronteira, lá estavam os marcos a barrar a passagem! Não podiamos entrar! Fechara, ao que diziam, trêsdias antes!
Quatro a cinco fiadas de arame farpado tolhiam o passo,
enquanto nos fixavam, de olhos chorosos, anseios e lágrimas,
que movian as pedras!
Soube então claro o que era uma fronteira e o que podem os' marcos' no destino humano!! Jamais esquecerei a linha intransponível, em hora tão amarga! Mas a vida é assim!

Ali ficámos, então, ao dispor da sorte! Ignorados no sítio,
morreríamos à fome, se a África do Sul não quisesse valer.nos! Os marcos insensíveis penetravam-me a retina, fixando-se nela por modo tal, que nada aí existe, para desalojá-los!

Vira nuitas fronteiras que passava em alvoroço e grande segurança: Portugal-Espanha; França- Bélgica; Alemanha-Itália;
Suíça-Andorra; Ceuta-Luxemburgo; Argélia-Marrocos e outras mais, Como aquela, porém, jamais encontrara!

É que esses marcos receberam lágrinas e ouviram queixumes da minha alma, em funda agonia.

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Lx. Belém
1985-03-15 Cont.

Os diversos 'marcos' a que fiz referência podem, na verdade, causar apreemsão, mas nunca repulsa. Estamos chegados ao que tinha em mente: outro género de marcos, Também sinalizam qualquer terreno! Para todos os efeitos avultam no solo
vestígios bem claros de alguns selvagens que ali esiveram.

Para eloquência, talvez nada haja que lhes seja igual! Ao passo que os outros só dividem campos, sem nada revelar, acerca das pessoas, costumes e jeitos, os derradeiros falam abundante, acerca disso.
Numa destas manhãs, em hora de ponta, houve bom ensejo de eu olhar para ele. Bem queria ignorá-los, que os não fixaria,
mas eles avultavam, fazendo-se notórios! Tive de olhar, forçosamente! Era uma fila, em circunvoluções, precisamente fixada, como todas as pessoas se haviam disposto - uma bicha extensa!
Esperava eu, ali mais abaixo, na soberba Praça, Afonso de Albuquerque, pois tinha em mira visitar a Amadora! Sucede, por vezes, gastar assim mais tempo ainda, que dutrante o percurso.

Dá-se isto afinal, querendo alguém viajar sentado, o que sempre ocorre, levando consigo peças de bagagem. Imagine-se, pois, o calvário molesto, repelente e asqueroso de esperar numa 'bicha', durante longo tempo! Não que falte a paciência! Esta chega sempre, desde que alguém se proponha ir lento e com serenidade

Uma urgência! Um caso melindroso que tenhamos de atender! Mil outras barreiras que se erguem ante nós?! Tudo isso pode ser!
Entretanto, não é o pior!
Ao lado da bicha, a toda a extensão, há uma fila de escarros e montões de saliva. Não será vergonhoso que um país antigo e multi-secular, com belas tradições, revele deste modo seu nível e costumes?! Como pode aguentar-se um pobre mortal, com hábitos decentes, numa fila assim?!

É, de facto, um martírio! Fechar os olhos? Ir-se embora dali?
Nada era possível do que vou sugerindo. A única saída era apenas v...! Contudo, fazendo-o, embora sem querer, agravava ainda o imundo panorama. Como defender-se a pobre criatura, nestas circunstâncias?! Haverá aí remédio para tais javardices?! Eu não o o veijo!Grato ficaria a quem mo indicasse!

Pois ali me aguentei, que não podia sair, mortificando os olhos, que sempre esbarravam com tal amostra!
Não se julgue, porém, que somente os olhos é que foram castigados, havendo de fixar, a todo momento aquele estendal!

E as pernas moídas que não podiam mover-se?!
Um pé descuidoso, colocado. sem controlo, ficava atingido!
Que grande seca! Ao perto e ao longe, sempre o mesmo abuso!
Que nível baixo o de certas pessoas! Quem faria aquilo?!
As casas respectivas hão-de estar bonitas! É que, se o fazem ali.
inconscientemente,..
Virá tempo ainda, em que os tais cuspidores se abstenham já de fazer aquilo? Quem dera que sim!

Era muito bom imitar, nestes casos, os vizinhos espanhóis.
Que alguém faça o mesmo ou atire ao chão papéis ou beatas, cascas de frutos ou outras coisas! Seja embora estrangeiro, surge logo um polícia que manda apanhar ou mesmo limpar.

Que dizia às alunas a cientista polaca, ao fazerem experiências no Laboratório? "Não lhes peço que limpem! O que eu não quero é que sujem!"
Esplêndida lição! Assim haja, para logo, quem deseje aproveitar! Em casos destes e outros semelhantes, nada aí há como fazem os Espanhóis: encarregam a polícia de colaborar,

O polícia não apanha: obriga o transgressor a levantar do chão a beata imunda, o papel enxovalhado, a casca da fruta,
apontando, com o dedo o caixote do lixo

******
Liceu (Nyangana-Namíbia)
1977-05-11
O Diário anterior falava de 'marcos' e presenças vivas; o de hoje, porém, fala doutros 'marcos' e presenças mortas.
Faz hoje dois anos, que a Maria Margarida já estava sepultada. Não houve poder que a livrasse da morte! Assim a perdemos, e o nosso coração encheu-se de luto, que o tempo e a
vida não logram delir.
Silva Porto, que abrigas piedosa seus restos mortais, não deixes que a menina seja afrontada, no sono eterno, para esta vida!
Melhor diria: 'eterno' é falso, porque todos nós havemos de erguer-nos, do túmulo em cinzas, para gozar no Céu, em corpo e alma, a
eterna, ventura. Lá, sim, não reina o ódio, que provoca assassínios! Só paz e bem-estar, junto a Deus-Pai!

Que mão tigrina pôde levantar-se, para tirar a vida a quem o Céu a dera ?! Que peito de onça pôde vibrar, para tecer em Angola um plano tenebroso, que privasse a inocente da vista dos seus?!
Que olhos malvados puderam acertar num alvo imaculado, em princípio de viida?! Como pudeste, assassino cruel erguer a espingarda, para tirar um bem que não tinha preço?

Não sentes remorsos que te levem a paz e roubem para sempre o sossego de espírito?! Como podes dormir, fera brutal,
que matas inocentes e roubas a outrem o que não é possível restitur-lhe jamais?! És tu, por acaso, o senhor da vida ?! Por que é que te arrogavas poder tamanho?!

De quem recebeste a ordem maldita?! Ai! Silva Porto, cidade mimosa,, que não liivraste a menina das garras aduncas de morte inglória!
A Maria Margarida também era tua. Foi ela, na ve r dade, que primeiro verteu lágrimas e doou seu sangue! Como era inocente, que te lave de manchas e alinde o teu! rosto! Cidade inesquecível, em que tanto chorei aquele anjo de carne!
Jamais olvidarei teus jardins refrescantes! Tuas belas avebidas e vivendas carinhosas!.Guardarei para sempre a memória saudosa de quamto deslumbrou o meu olhar e o dela!

Ó rua tão querida -. Sallvador Correia - que a vias passar, açodada e vibrante, quando pressentia que a vida chegava,! E tu, ó
rua do Albergue, e também tu, a do Colégio Militar, chorai angustiadas a menina infeliz, que deixou de trilhar vossos lindos passeios!
Ó belo jardim, ao Largo mimoso e desafogado, junto à Catedral, onde as águas crtstalinas e as flores perfumadas suavizaram ardores e criaram ambiente, para a Guida se encantar!,

Queridos amigos e bons vizinhos, chorai comigo também a menina roubada! Zeca e Fatinha, que de perto a tratáveis, vivendo com ela amarguras e dores,, alegrias e prazeres, uni-vos a mim: pranteemos a desdita qe a todos vergou!
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Liceu
1977-05-12
Continua a Inspecção, no Liceu Shashipapo.
Os cade rnos que havia, com trabalhos escritos tudo foilevado para a vasta Biblioteca. De notar, para já, que os nossos alunos têm dois
cadernos, em cada matéria, o que perfaz,sem dúvida, um total respeitável!
Cada professor apresent, por seu lado, a escrita diária, respeitante aás aulas: : registo de faltas esquema de trabalho; livro
de Sumários.
Para mim, estranjeiro, foi difícil em extremo, por não fazer ideia, acerca de pormenores.
Refiro-me neste passo, ao esquema de trabalho. Em 32 anos, consagrados ao Ensino,, jamais havia feito coisa semelhante!

A muito custo, lá pus em ordem o esquema pedido.
Vamos ver o resultado!
O maior mal que pode acontecer-me é darem por finda a minha missão, no fim deste ano! Aguardo, no entanto, com certa confiança! Deus ajudará!

Após o meu regresso à Pátria qerida, , é muito provável que deixe o Ensini, embora me custe!. Dedicarei o meu tempo somente à escrita, Há Diários a rever... Diários a copiar e não sei que mais!
Quanto ao dia de hoje começou efervescente .Logo pela manhã, às 7 menos 15, tive eu de falar, em língua inglesa,, perante a Inspecção e o Corpo Liceal.

Os nervos tenros ainda actuaram, mas tudo foi bem.
Antes do início, faltou-me o fôlego. Paracia.me até que a boca secava, ficando a garganta quase destruída.
Apesar de tudo, havia-me preparado, com certo afinco! Os
nervos, porém, atacam em cheio, nestas ocasiões!
Não presto, já se vê , para casos deste género!!

Feitio infeliz, para testes orais!Mas que fazer?!

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LIceu
1977-05-13

Decorre, ao presente. o Teste de Africânder,na
turma enorme "Form II B" que estou vigiando.
Apesar de muito longe e absorvido também por mil cuidadoS que o momento vai criando, o meu pensamento voa açodado,
para a terra potuguesa, que trago sempre, no meu coração!

Treze de Maio! Num peito lusitano, entra fundo esta voz, que nos fala do Céu! Faz 60 anos, que a Virgem Senhora desceu das alturas, para encaminhar-se à Pátria lusa, aonde levaria preciosa Mensagem.
Veio: Portugal escuto, harto embevecido, a voz maternal:
" Penitência e Oração", divulgando pelo orbe o recado urgente!.
"Jesus - declarou -. está muito ofendido! Se não houver emenda, virá o castigo|"
Qual mãe extremosa avisa seus filhos, assim a Padroeira ,
avisa Portugal. Terámsido efcaz o convite-amaça? Vem ao de
cima, nedta hora crucial, a tragédia sem nome que vergou
impiedosa o mundo portuguªe: brancos e pretos, amarelos e mesi-tiços...
O sofrimento e a morte feriram em cheio corações portugueses. Será tarde ou jamais que estes ecos sinistros irão apagar-se!
Assassínios bárbaros, e entes queridos; espancamentos;; roubos e assaltos; depradações;; violências e maus tratos; expoliação impiedosa de migalhas e poupanças, ao longp de uma vida; incerteza do fituro; lágrimas e dores;; extravio de fam~ilias e ses afins...

Meu Deus, tende compaixão do mubdo portyguês, através do orbe! As criancinha... os pobres velhinhos... mulheres e donzelas... Todos!! Que grande infortúnio, Senhor dos Aflitos!
Amparai este povo que foi sempre cristão e rejeita, por isso o Comunismo ateu!
Senhora de Fátima, que vieste do Céu à Cova da Iria, para que o mundo escutasse depois a tua mensagem, inclinando-se à emnda, atende os rogos que hoje se levantam, em solo portuguès!.

Não é apenas o sector lusitano que está gemendo,: é todo o orbe! Só guerras e ódios, violência, desacatos! Para onde caminhamos?! O mundo está doente, porque olvida o seu destino!,
Virgem de Fátima, pede ao Senhor que tenha compaixão e derrame
em noso peito o bálsamo da paz!. Compenetrer-se o mundo de que o seu destino é longe daqui!

Após a vida agitada , outra esfera: nos aguarda: mundo celest, em presença de Deus, o qual é feito de paz, amor e ventura.
Boa Mãe do Céu que és hoje aclamada, atende os meus rogos!

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Nyangana
1877-05-14.
Ontem, cheguei à Missão, em fim de semana., Havendo entrado na sala de jantar, vi apenas talher para o Rmão Eusébio, nativo do Kavango. Nem o padee Hermes nem Bruder Shedel!!
Coisa bem estranha! Logo os dois brancos!
Senti-me isolado, em terra inimiga! De facto, é zona operacional,, embora até aqui nada lamentável, haja ocorrido.

Entretanto, o bom padre Hermes quebra, em parte, a minha solidão! Que falta me faz! Agora, noto o que vale para a minha pessoa! Sem ele aqui, tudo é gelado e sem atractivo! Que saudades eu tenho! Foi a Vinduque levar o irmão, que seguirá depois a caminho da Alemanha!
Este fim de semana é assaz triste! e desenxabido! A frieza do ambiente comunica-se à minhalma, que logo envelhece e perde o alento! Afinal, o que me prende aqui +e o bondoso padre Hermes, pela sua gentileza e pronta ajuda,

Que seria de mim, sem um ar de afecto, que tocasse ao vivo!
Que viver desconsolado arrasta o solitário,, fechado em si mesmo, sem convívio nem estima! É planta calcada a que outrem não atende! Todos passam por ele, sem niso atentar! É ente ignorado, cuja dor não conta nem as lágrimas comovem!

É areia perdida na praia distante, confundida e rolada. ao longo dos tempos!... É gota escoada em lôbrega caverna, que se dilui e mistura no conjunto da água! Pobre ser desprezado que ninguém já espera, ao longo da vida! Só em Deus confia, no amargo pungir de seus males e dores!
Que o Céu te valha. pois a Terra ignra o teu nome

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Nyangana
1977-05-15
Quando estive no Rundo, agerdando o Cirurgão, soube algumas novas, bem desagradáveis, a respeito de Angola.
É verdade comprovada que não passo ndiferente, perante o vasto
mundo que foi portuguê! Se conserva na alma traços indeléveis do nosso covívio!
Povos e gentes desse mundo que sofre levantam simpatia no
meu coração, Ao falar com eles, vibro intensamente, e sofro também! Seus males e dores afectam e prostram-me. Verifiquei-o
no Rundu, privando ali com Angolanos que ignoram o paradeiro de seus familiares. Como é desesperante e assaz lamentável !

Comovem as pedras, ao narrar em lágrimas a tragédia pessoal! Soube ali também que o chefe da UNITA caíra há pouco numa emboscada, O MPLA esteve quase a retê-lo, pois o atingiu com mais de 20 tiros! Ainda assim teve mais sorte que os seus gurrilheiros, que morreram todos. à excepção dede 1!

Levado para vinduque, foi ali tratado. Ao presente, encontra-se bem.. Será exacto aquilo que ouvi?! Deus o sabe!
Informaram também que 70% da população já foiassassinada!
Não será genocídio o que está ocrrendo?!Ond e está, nesse caso, o povo angolano?! Sepultado acaso na barriga das feras?!

Triste findar coube a Portugal!, motivado por gente que empolgou a Revolução! Foi esse o motivo por que esta degnerou, provocando assim milhões de infelizes.Vítimas foram aque les que tombaram e mais vítimas ainda aqueles que estão de pé-

Como eu gostaria que o povo angolano, assim como os povos da grande Comuidade, chamada Lusófona,vivessem felizes e passassem bem!! Dói-me a alma e choro inconsolável o triste destino a que foram votados!

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